A tinta e a lápis
Escrevem-se todos
Os versos do mundo.
Que monstros existem
Nadando no poço
Negro e fecundo?
Que outros deslizam
Largando o carvão
De seus ossos?
Como o ser vivo
Que é um verso,
Um organismo
Com sangue e sopro,
Pode brotar
De germes mortos?
O papel nem sempre
É branco como
A primeira manhã.
É muitas vezes
O pardo e pobre
Papel de embrulho;
É de outras vezes
De carta aérea,
Leve de nuvem.
Mas é no papel,
No branco asséptico,
Que o verso rebenta.
Como um ser vivo
Pode brotar
De um chão mineral?
(In Novas Seletas de João Cabral de Melo Neto, p. 25)
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