Dólar bate R$ 2,42 e Mantega diz não saber onde vai parar.
BC e Tesouro fazem ação conjunta, mas não conseguem segurar cotação.
Moeda americana dispara e governo promete para hoje nova ofensiva de US$ 4 bi em intervenções no mercado financeiro para conter a desvalorização do real. Ministro pode reduzir tarifas de importação.
Num dia tenso no mercado, o Banco Central e o Tesouro fizeram ação conjunta para tentar conter a alta do dólar e de juros futuros, mas não conseguiram. Mesmo com intervenções de mais de US$ 3 bilhões, a moeda americana fechou em R$ 2,416, com alta de 0,83%, depois de ter batido R$ 2,429. Hoje haverá nova intervenção de US$ 4 bi. Com a expectativa de que o BC dos EUA suba juros, o dólar se valorizou em quase todo o mundo. "Nós não sabemos onde isso (a subida do dólar) vai parar"," admitiu o ministro Guido Mantega. Segundo ele, o governo poderá reduzir tarifas de importação para aliviar o efeito sobre a inflação.
Arsenal sem efeito
Ação conjunta de BC e Tesouro de mais de US$ 3 bi não segura dólar, que fecha a R$ 2,416
SÃO PAULO, RIO E BRASÍLIA - Num dia de tensão no mercado financeiro, nem mesmo a atuação conjunta do Banco Central (BC) e do Tesouro foi capaz de impedir a escalada do dólar e a alta das taxas dos contratos de Depósitos Interfinanceiros (DIs). A moeda americana fechou com valorização de 0,83%, a R$ 2,416, a maior cotação desde 2 de março de 2009, quando a divisa havia alcançado R$ 2,442. O esforço concentrado ontem do BC e do Tesouro contra o avanço da moeda americana ultrapassou os US$ 3 bilhões. No câmbio turismo, utilizado pelos brasileiros que viajam ao exterior, o dólar terminou negociado a R$ 2,54, uma alta de 1,60%.
O Banco Central fez duas operações de swap cambial - operação equivalente à venda de dólares no mercado futuro - que totalizaram US$ 2,6 bilhões, além de uma rolagem de contratos de US$ 986 milhões. O Tesouro recomprou títulos prefixados para acalmar o mercado, num leilão extraordinário que movimentou R$ 1,6 bilhão (cerca de US$ 662 milhões). E a ação está longe do fim. No fim do dia, o BC anunciou que fará dois leilões, numa operação que equivale a um empréstimo de dólares com compromisso de recompra no futuro, no valor de US$ 4 bilhões.
O quadro de instabilidade levou o presidente do BC, Alexandre Tombini, a ir a público indicar que poderá vender dólares no mercado à vista, se for preciso, para acalmar a situação. "Nesse contexto, (o BC) não deixará de ofertar proteção ("hedge" cambial) aos agentes econômicos e, se necessário, liquidez aos diversos segmentos do mercado", disse Tombini, em nota. Desde o fim de maio, quando se intensificou o processo de valorização da moeda americana, o Banco Central já injetou US$ 37,17 bilhões em operações no mercado futuro, mas no período a moeda acumula alta de 14,3%. Ontem, o real foi a terceira moeda com maior desvalorização frente ao dólar. Somente o peso mexicano e o rand sul-africano tiveram perdas mais intensas.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que o mercado de câmbio está vivendo um momento de estresse, mas que a situação cambial está sob controle. Ele recomendou que os investidores não façam apostas contra o real e reiterou que BC e Tesouro têm mais instrumentos para evitar maiores oscilações e impactos sobre a inflação.
- Nós não sabemos onde isso vai parar (a subida do dólar). Alguma influência deverá ter, mas ainda não teve - disse Mantega.
A alta do dólar fez as taxas dos contratos de Depósitos Interfinanceiros (DIs) dispararem. O Tesouro Nacional anunciou de surpresa um leilão e comprou cerca de 2,150 milhões de unidades de Letras do Tesouro Nacional (LTNs, papéis prefixados com o resgate do valor do título na data do vencimento) e de Notas do Tesouro Nacional- Série F (NTN-Fs, papéis prefixados com pagamento de juros predefinidos semestral e resgate do principal na data de vencimento do título).
A elevação do rendimento dos títulos de dez anos, nos EUA, que estão oferecendo taxa de 2,8%, a mais alta em dois anos, também pressionou os juros dos DIs no Brasil. A taxa do contrato de DI de janeiro de 2014 subiu de 9,2% para 9,33%. O vencimento para janeiro de 2015 passou de 10,33% para 10,66%.
- Ao entrar no mercado e recomprar esses títulos com taxas elevadas, o Tesouro mostra que não consegue se financiar com essas taxas muito elevadas, típicas de momentos de pânico. Mas vai ser difícil controlar. O Tesouro fez o papel dele. As taxas recuaram um pouco após o leilão, mas voltaram a subir e fecharam perto das máximas - disse Paulo Petrassi, responsável pelas operações de Renda Fixa da Leme Investimentos.
Impacto no 3º tri para empresas
Um técnico do Tesouro Nacional assegurou que o órgão fará quantos leilões forem necessários para reduzir a pressão. Para o Tesouro Nacional, o nível de volatilidade está alto demais. Tombini concorda. Em nota, afirmou que as taxas de juros negociadas no mercado incorporam "prêmios excessivos". Sobre a turbulência no câmbio, prometeu que não faltará instrumentos de hedge para o que chamou de "processo de realinhamento global das moedas".
O presidente do BC ainda fez um alerta. Lembrou que cotações oscilam e que pode haver perdas com apostas. O cuidado é para evitar que situações ocorridas em 2009, no auge da crise, se repitam. Grandes companhias tiveram perdas bilionárias por usarem instrumentos de hedge para apostar no mercado financeiro.
A escala do dólar preocupa a equipe econômica por seu impacto na inflação e pela busca de hedge (proteção) pelas empresas. As companhias procuram esses mecanismos de blindagem contra a variação do câmbio e dos juros em momentos de volatilidade. O problema é que essa demanda alimenta ainda mais a alta da moeda americana e das taxas de juros. Em relatório, o Citibank avaliou que, mantidos os níveis atuais do câmbio, as empresas brasileiras que têm dívidas em dólar podem sofrer novo impacto nos balanços do terceiro trimestre. Em janeiro, a expectativa do mercado era que as 63 companhias de capital aberto listadas no Ibovespa lucrassem R$ 166 bilhões. Essa expectativa hoje é de R$ 155 bilhões, com o câmbio e o crescimento menor da economia.
Em e-mail a clientes, o representante de um grande banco disse que, superada a barreira de R$ 2,40, o próximo limite da cotação americana seria de R$ 2,62. A nova valorização depende do comportamento dos juros nos EUA. A expectativa do mercado é que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) inicie a retirada de estímulos à economia ainda neste ano. A perspectiva é que após o fim desse processo, os juros subam nos EUA.
Para Antônio Correa de Lacerda, professor da PUC de São Paulo, a atuação conjunta do Banco Central (BC) e do Tesouro pode apenas "amenizar a valorização da moeda, mas não resolve o problema". Segundo ele, a tendência é que a pressão sobre o câmbio e títulos continue nas próximas semanas.
- O câmbio de R$ 2 é coisa do passado. Mas existe uma pressão, que vem da mudança da política monetária americana e de fatores internos, que continuará nas próximas semana, mas que vai se amenizar no futuro. O mercado pode estar exagerando - avaliou Lacerda.
Fonte: O Globo
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