• Ao governo falta discurso, mal que atribuía à oposição
- Valor Econômico
Gilberto Carvalho, o ministro chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, considerado o homem-Lula no governo Dilma, contrariou a liderança do presidente do partido, Rui Falcão, para fazer avaliações que evidenciam equívocos nas opções do comitê de reeleição coordenado por ele. Aos blogueiros governistas, fez um discurso moderado, surpreendente até para os seus colegas de partido. Defendeu a tese de que, ao contrário do judas escolhido pelo partido para imolar pelos insultos a Dilma no Itaquerão, tentando vitimizá-la, não é possível atribuir à "elite branca" (o que estariam fazendo a negra e a amarela naquele momento?) o ódio ao PT de que falara seu mestre dias antes daquele.
Sua tese: é generalizada a saturação com os erros do PT e já está impregnado na sociedade o sentimento de que o partido é vencedor no campeonato da corrupção.
Quando a cúpula petista ainda tentava fazer uma exegese dessas declarações que a denegrisse menos, Gilberto Carvalho reincidiu na franqueza e explicou, em entrevista à 'Folha de S. Paulo', que sua declaração foi intencional e não produto de um escorregão ou interpretação distorcida da imprensa, como é praxe alegar. Teve o objetivo de alertar o PT para o fato de que espalhou-se no país a insatisfação com o governo e com o partido.
Gilberto Carvalho, ministro, estaria, portanto, falando com sinceridade o que acredita ser a verdade, e dando voz à preocupação de muitos insatisfeitos com a condução da campanha da reeleição e que gostariam de corrigir, enquanto é tempo, ações e discursos. Gilberto Carvalho fez uma boa síntese de suas intenções que assim podem ser entendidas: não quer tergiversar no diagnóstico, porque enquanto não se chega à verdade do que acontece de fato, não se toma o remédio certo.
O ministro, que também coordena a negociação com os movimentos sociais que protestam, confessou, na sua terceira manifestação, ontem, também na Folha, que já foi inclusive vítima do método black-bloc de impaciência com o governo: atiraram-lhe um rolo de papel higiênico.
Amigos de Lula e admiradores de Gilberto afirmam que nada há de Lula ou do movimento Volta, Lula nessa manifestação do ministro. O secretário geral da Presidência e ex-secretário particular e chefe de gabinete de Lula no Palácio do Planalto, Gilberto Carvalho, está falando por si e por muitos insatisfeitos do partido com a condução da campanha, e tem autonomia, além de não se ver problema em reconhecer "certa realidade". Complementa-se: melhor agora que mais à frente.
A campanha, realmente, está sofrendo de alguns males, mas o principal parece ser a faísca do choque de opiniões que impedem a definição de um discurso.
Franklin Martins, ex-ministro do governo Lula, integrante do comitê de reeleição da presidente Dilma, tem grande poder no grupo, é o comandante das atividades políticas e eleitorais do partido na Internet, e está em conflito aberto com o publicitário do partido e da campanha, o jornalista João Santana. Martins e Santana divergem na essência, na concepção do projeto.
O primeiro estaria forçando a radicalização, o discurso de ataque, uma performance que seria mais condizente com seu perfil político, enquanto João Santana, que não foi guerrilheiro nem militante, quer imprimir um tom definido como mais jornalístico, programático à campanha, ressaltando o desempenho e a história da candidata.
O primeiro falaria por Lula, o segundo por Dilma. Só que Lula, às vezes, fala na linha de um, em outras toma o caminho do outro, quando não saltam as contradições dentro do mesmo discurso. Petistas de dentro da campanha veem Rui Falcão, presidente do partido e coordenador do comitê, mais voltado à guerra do que ao equilíbrio, mas, sobretudo, voltado para seu pequeno grupo, sem ampliar o acesso a outros que se consideram também proprietários do negócio.
O personalismo e a tentativa de hegemonia do presidente do PT estariam levando a candidatura a não sair da linha de defesa de maneira adequada. Gilberto saiu da Igreja; Franklin da luta armada; Santana do jornalismo; Lula é contemporização ou guerrilha, depende da hora.
Um exemplo de ontem: com o sucesso da Copa e o recolhimento dos movimentos sociais contrários, Lula tentou retomar para si a fatura, saindo da discrição onde aguardava os desdobramentos para ver no que ia dar. Optou pelo mais fácil e acusou a imprensa brasileira de ter influenciado a imprensa estrangeira a acreditar que não teria Copa, que nada ficaria pronto, nada daria certo. E, no entanto, aí está, uma Copa cheia de gols, gols feitos, claro, por Lula. Não se sabe se o auditório, qualificado, levou a análise a sério. Dilma também tentou, ontem, faturar o sucesso da Copa, falando em convenção de partido aliado, mas evitou criminalizar a imprensa e a oposição, citando nominalmente apenas o "Não vai ter Copa", um dos movimentos que Gilberto Carvalho tenta tourear no seu périplo de negociação com essas correntes.
Ou seja, está saindo muita fumaça pelas frestas do comitê de reeleição. Franklin e Santana estão em guerra; Gilberto discorda do monopólio de Rui Falcão; as facções do Volta, Lula querem participar, agora que o grupo ficou no vácuo; Lula é pendular; Dilma, a candidata-esfinge. Que estaria pendendo para as teses de João Santana, que não são necessariamente as de Rui Falcão, essas mais próximas das de Franklin Martins, a quem Lula faz concessões.
No fim dessa ciranda a evidência de que o governo sofre do mal que sempre atribuiu à oposição: a falta de um discurso. Os adversários de Dilma já disseram o que é bom, e vão manter, o que está ruim e vão mudar, como a Economia, por exemplo, como e com quem. Seus ministros estão praticamente escalados.
O governo, que pleiteia a renovação da confiança do eleitorado, diz que tudo vai bem, quer continuar a mudança mas não sabe ainda para que rumo, para quê, e com quem. Um dia, reconhece erros na economia. No outro, não passam de problemas provocados pela situação internacional. Nomes do novo ministro da Fazenda e presidente do Banco Central, que possam dar um sopro de credibilidade ao governo para uma reeleição segura, nem pensar.
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