• Dilma perdeu a confiança em Michel Temer, depois que o vice-presidente disse que o o país precisava de “um líder que unificasse o país”; também faz gestos de que o ministro da Fazenda não lidera a equipe econômica
- Correio Braziliense
Um dos critérios para analisar a grave conjuntura que atravessa o país é identificar suas linhas de força, ou seja, aquelas tendências que se projetam para o futuro, ou seja, além do horizonte político imediato. Grosso modo, são três: o agravamento da crise econômica; a desarticulação da base do governo no Congresso; e a Operação Lava-Jato. A presidente Dilma Rousseff tem responsabilidade direta nas duas primeiras, e indireta na terceira, por sua omissão no primeiro mandato em relação aos “desfeitos” na Petrobras.
O grande problema é que a presidente da República, diante dessa crise tríplice, tem se revelado incapaz de debelá-la. Pelo contrário, suas intervenções no processo acabam sempre por torná-la mais dramática. O dia de ontem foi a prova disso: o vice-presidente Michel Temer entregou o posto de articulador político do governo no Congresso e o ministro da Fazenda, Joaquim levy, cada vez mais desprestigiado, tirou três dias de folga e foi dar uma voltinha em Nova York. Ambos foram atropelados por Dilma Rousseff, uma espécie de quem manda aqui sou eu, mas que revela como o comportamento da Presidência é errático.
Quando se tem um problema complexo, o melhor a fazer é desagregá-lo em várias equações simplificadas e resolvê-las uma a uma. Parecia ser esse o caminho quando Dilma nomeou Levy para a Fazenda e Temer para a articulação política, deixando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a responsabilidade de acalmar o PT e mobilizar apoios dos movimentos sociais ao ajuste fiscal. Mas parece que a presidente da República nunca esteve convicta de que esse era o caminho a seguir, muito menos os ministros da cozinha do Palácio do Planalto, sem falar nas bancadas do PT no Congresso e nos líderes petistas dos movimentos sociais, principalmente da CUT.
Em circunstâncias normais, esse arranjo permitiria ao governo viabilizar o ajuste fiscal, rearticular a base do governo e manter distância regulamentar da Operação Lava-Jato. O horizonte político imediato seria a eleição municipal, na qual os partidos acumulam forças para disputar o poder central. Nesse cenário, a crise política seria absorvida e a economia, melhor gerenciada. A Lava-Jato é uma contingência com a qual todos teriam que lidar.
Mas não é isso que está acontecendo. Dilma perdeu a confiança — se é que a teve em algum momento — em Michel Temer, envenenada por seu estado-maior, depois que o vice-presidente disse que o o país precisava de “um líder que unificasse o país”; também faz gestos de que o ministro da Fazenda não lidera a equipe econômica, dando sucessivos sinais de que o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, é o seu preferido. O ex-presidente Lula é um capítulo à parte. Criador e criatura andaram se estranhando, a ponto de o primeiro conspirar contra a segunda, mas a Lava-Jato chegou muito perto de ambos.
Pode piorar
A retórica do governo é surreal. Michel Temer saiu do Palácio do Planalto sem falar com a imprensa, mas o líder de governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), difundiu a versão de que Temer cuidará da macropolítica, apenas deixará o varejo da distribuição de cargos e verbas. Ao mesmo tempo, assessores do Planalto vazaram para a imprensa que o responsável pela saída de Temer era o ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
Recentes manifestações do empresariado contra o impeachment de Dilma Rousseff deram ao Palácio do Planalto a certeza de que o establishment apoia o governo incondicionalmente. Mas a maioria não pretende fazer grandes investimentos enquanto Dilma estiver no poder, por causa das incertezas políticas e de seus zigue-zagues na economia. O que se quer é que a situação não se agrave mais do que já está, até a sucessão em 2018.
A saída de Temer da articulação enfraquece ainda mais o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que tinha no vice-presidente o seu maior aliado. Ou seja, a crise política se agravou e nada impede que a mesma coisa aconteça com a economia. Aliás, o reforma administrativa para reduzir de 39 para 29 os ministérios e extinguir 2 mil cargos comissionados, anunciada ontem pelo ministro Nelson Barbosa, é um sinal de que a bola não está com Levy. Vamos ver o que acontece na reacomodação da base do governo.
Por último, tem a Operação Lava-Jato, cada vez mais eletrizante. Hoje, por exemplo, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado será palco da sabatina do procurador-geral Rodrigo Janot. Na primeira fila estará o ex-presidente Collor de Mello (PTB-CE), que ontem foi á tribuna para chamá-lo de “fascista” e “sujeitinho à toa”.
Dilma aposta na defenestração do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), seu desafeto, para recuperar o controle do Congresso, depois do acordo com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que também está sob investigação da Lava-Jato, como mais 44 políticos não denunciados ainda por Janot. Dilma aposta na Lava-Jato para tirar do caminho seus adversários no Congresso, mas as investigações atingem de morte o PT. Será que isso vai mesmo dar certo?
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