• Dilma Rousseff e Aécio Neves agora só precisam combinar seus planos com as ruas. As calçadas estão cada dia mais cheias de desempregados
- O Globo
A segunda- feira estava nublada em Nova York. Letreiros eletrônicos na Times Square anunciavam a descoberta de água em Marte. Visto da cadeira presidencial, o futuro transparecia promissor. Se há dificuldades, ressalvou Dilma Rousseff na Assembleia Geral da ONU, são circunstanciais — derivadas do moinho de forças ocultas da crise mundial. O importante, lembrou, é que “no Brasil, o processo de inclusão social não foi interrompido”.
A manhã de ontem também estava nebulosa a 7.800 quilômetros de distância. O líder da oposição deixou seu confortável apartamento na Zona Sul do Rio para contemplar o horizonte. Não poderia estar melhor, concluiu o senador Aécio Neves, presidente do PSDB: “Em nenhum outro momento dos nossos 27 anos de história tivemos momento tão positivo, porque o PSDB é antítese disso que está aí, do mal que aconteceu com o Brasil.”
O país de Dilma e Aécio, porém, estava dominado por uma certeza: no fim do dia, um novo contingente de mais de três mil brasileiros estaria desempregado.
Foram 573 mil demitidos de janeiro a agosto. Na média, mais de 3.300 demissões a cada dia útil, ou 1.100 a cada turno de oito horas.
O ritmo de desemprego não deixa dúvida sobre o panorama deste início de primavera: em outubro o Brasil deve ultrapassar a marca do milhão de novos desempregados nos últimos 12 meses.
Na região metropolitana de São Paulo, onde a maioria do eleitorado proporcionou uma inflação de votos ao oposicionista Aécio na eleição passada, a taxa de desemprego passou de 5,1% para 8,1%, entre julho de 2014 e agosto último.
No Nordeste, cujos eleitores viabilizaram a reeleição de Dilma, o desemprego cresce a velocidade significativa. Em Salvador, por exemplo, o índice era de 9,3% em agosto de 2014. Subiu para 12,4% no mês passado. Governo e oposição, porém, fingem nada ver. Dilma se mantém prisioneira de si mesma, contornando o quadrado retórico que traçou mentalmente — assim, nas suas palavras: “Nós sabemos que muitas pessoas no Brasil, em algum momento do passado, repetiam algo que escutavam em certas áreas e repetiam por não ter uma contraposição, por não ter uma consciência diferenciada...
Qual era essa história? Essa história era uma história simples: era dizer que os pobres eram pobres porque queriam ser pobres; que os pobres eram pobres porque tinham preguiça, e não que os pobres eram pobres por um processo de exclusão histórica e sistemática do nosso país, que começa com a escravidão.”
De volta a Brasília, Dilma começa dia de hoje resolvendo o problema do desemprego entre aliados. Vai entregar mais cargos a integrantes da sua base parlamentar, na tentativa de preservar o próprio emprego. Chama isso de reforma ministerial.
Aécio continua a repetir seu mantra predileto: “Nós não vamos virar as costas para as dificuldades que o Brasil e que você está atravessando.” Como? Não respondeu na campanha do ano passado, nem parece motivado a fazê- lo por enquanto, mas ontem inovou ao prometer na televisão que vai lutar “dentro das regras democráticas”.
A presidente e o líder da oposição agora só precisam combinar seus planos com as ruas. As calçadas estão cada dia mais cheias de desempregados.
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