quinta-feira, 5 de maio de 2016

Repartir para governar - José Roberto de Toledo

- O Estado de S. Paulo

Michel Temer acha que, dividindo Brasília, vai unir o Brasil. Um ministério para um partido aqui, outro para uma igreja acolá, e o futuro ex-vice calcula que conseguirá somar os 308 votos que precisa na Câmara para aprovar reformas constitucionais. Reformas para controlar os gastos públicos, se diz. Pois, antes de poupar, Temer se pôs a gastar seu pouco capital político.

A ideia de reduzir os ministérios ao número de prédios da Esplanada foi há muito esquecida. As 17 caixas de fósforos – como são chamados os edifícios retangulares ao longo do Eixo Monumental de Brasília – e os palácios da Justiça e do Itamaraty são obviamente insuficientes para Temer acomodar todas as suas dívidas. Como não bastaram para quitar as de seus antecessores.

A conta já está em 26 futuros ministros e, ainda assim, não estão cabendo todos os candidatos. A romaria diária ao Palácio do Jaburu só cresce e, de tão concorrida, já desmembrou-se em uma fila alternativa na porta de Eliseu Padilha, o futuro ministro ainda sem pasta, mas com acesso ao ouvido de Temer.

Ora é o PP que exige três ministérios para começar a brincar, ora é a bancada de deputados do próprio PMDB que se diz injustiçada. O futuro ex-vice não pode, porém, negligenciar os senadores que, goste ele ou não, terão a palavra final sobre o seu mandato durante o julgamento de Dilma Rousseff. Por isso, precisam também ser privilegiados na divisão do butim.

Não bastassem os partidos exclusivamente fisiológicos, como o PR e o PSD, Temer ainda tem que acomodar aliados de primeira hora. Ele precisa amarrar o PSDB para não se ver abruptamente abandonado pelos tucanos quando estes perceberem que a nau está vazando. Apesar dos discursos desinteressados e das cartas programáticas, ele precisa de três posições na Esplanada para contentar os três caciques do partido: Serra, Alckmin e Aécio.

É uma matemática complicada porque a soma das partes é maior do que o todo. Partidos demais, centrais sindicais e federações empresariais de sobra, sem contar 27 bancadas estaduais. Assim, já se fala em “adiar” a redução do número de ministérios. Quem sabe cortar um ou dois dos 32 não baste para pagar o pato?

Se a questão se limitasse à quantidade de ministros e aos cargos com altos salários que cada um deles multiplica já seria desgaste suficiente para um presidente que chega ao Planalto com votos emprestados por algumas centenas de parlamentares. Mas há o problema da qualidade dos ministros.

Os tidos como certos até agora são políticos profissionais. Quem ainda não é, como Henrique Meirelles, pretende sê-lo. Os demais estão ali porque Temer lhes deve, não porque os admire. Assim, a contabilidade ministerial vai ficando criativa. Inclui uma pedalada científica, colocando um ministro criacionista para batizar as verbas de fomento à pesquisa darwinista.

Todos os balões de ensaio com nomes de especialistas para ministérios sociais, como Saúde e Educação, murcharam em poucas horas. Uns nunca cogitaram ir, outros desistiram ao perceber que teriam que ceder cargos aos partidos. Se algum vier a aceitar – já ficou claro –, terá que ser flexível na formação da equipe.

Sem contar os inúmeros ministros repetidos de governos passados e os ministeriáveis investigados pela Lava Jato. Alguns podem se orgulhar de estar em ambas as categorias. Diante do inevitável, Temer já modulou seu rigor ético. Disse que a investigação é só uma investigação e que não deve impedir uma eventual nomeação. Nada como um choque de realpolitik para transformar o discurso de campanha em discurso de governo.

E qual partido que já ocupou a cadeira onde Temer tanto quer sentar pode censurá-lo? O sistema político-eleitoral brasileiro assim exige e assim é. Por isso, o ministério Temer caminha para ser nada surpreendente e duvidosamente bom.

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