sexta-feira, 31 de agosto de 2018

César Felício: O jogo de empate entre a TV e as redes sociais

- Valor Econômico

Incerteza é inédita e impacto de horário eleitoral é incerto

Em uma tabela preparada pelo cientista político Jairo Nicolau, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é possível perceber as particularidades únicas desta eleição. Desde 1989, cinco candidatos tiveram mais do que 40% do tempo no horário eleitoral gratuito de rádio e televisão, como Geraldo Alckmin tem agora. O próprio Alckmin em 2006, Fernando Henrique Cardoso em 1998 e Dilma Rousseff em 2010 e 2014. Todos tiveram mais de 40% dos votos.

Nicolau também mediu qual a votação de cada um dos candidatos no primeiro turno. Ninguém com menos de 10% do tempo na televisão foi para o segundo turno. Mas se o levantamento abrangesse também a posição de cada candidato nas pesquisas de opinião pública no início do horário eleitoral, constataria que ninguém que pontuava abaixo de 15% cruzou a barreira do segundo turno, independentemente do tempo que dispunha na televisão, com uma única exceção: Luiz Inácio Lula da Silva, na eleição de 1989.

Os três grandes donos da mídia eletrônica nesta eleição, Alckmin, Meirelles e Haddad, a se confirmar a substituição dentro da chapa petista, estão abaixo deste patamar. O estudo de Nicolau, que se restringe ao resultado nas urnas e não leva em conta as pesquisas de opinião, está disponível na conta da rede Twitter do professor.

Há portanto um jogo de dupla negativa: se Alckmin for ao segundo turno, será um feito praticamente inédito, o que destacará de maneira impactante a relevância deste fenômeno. Uma ascensão de Haddad estaria ligado a outro fenômeno, o da transferência de votos, que também nunca atingiria semelhante proporção nestas circunstâncias. Se Jair Bolsonaro ou Marina Silva passarem para a segunda rodada, será algo completamente sem precedentes, uma vez que ninguém com menos de 5% do tempo sequer se aproximou do sarrafo do segundo turno. Ciro Gomes conta com este percentual do horário eleitoral. É o mesmo que ele teve em 1998, quando ficou com 11% do total válido.

Fica estabelecido portanto que qualquer resultado este ano será fora do padrão, um ponto fora da curva na correlação entre popularidade prévia do candidato e uso do horário eleitoral. O absurdo ronda qualquer variável.

Para um experimentado aliado de Alckmin, o deputado Heráclito Fortes (DEM-PI), que já foi um dos cardeais da política de seu Estado, praticamente varrido das urnas na década passada e que ressuscitou em 2014, a esperança do tucano reside mais na debilidade dos demais do que em qualquer outro fator.

"Estamos há 40 dias da eleição e não tem ninguém consolidado. Quando falo em consolidado, falo em presença garantida no segundo turno", diz. Nem Bolsonaro? "Nem Bolsonaro", responde o parlamentar. "Ele é quem está mais perto disso, mas basta uma queda de três ou quatro pontos percentuais nas pesquisas, uma transferência desta ordem para outro candidato e será o suficiente para que também esteja na zona de incerteza", afirma.

Com a vivência de ser de um Estado vizinho do Ceará, alerta que Ciro Gomes não pode ser descartado. Em sua opinião, pode auferir ganhos expressivos na dispersão que fatalmente existirá no processo de transferência de votos de Lula para Haddad. E sobre Alckmin? "O programa eleitoral será fundamental. Agora, se ele sobe ou não, não sei".

Bolsonaro não está consolidado porque, imperando na internet, parece ter encontrado um teto. Estudo de monitoramento digital da empresa .MAP mostra que nas redes sociais Bolsonaro está com uma base sólida. De junho a agosto, a presença do parlamentar dá um salto de nada menos que 1.000%. A empresa captura 30 milhões de postagens por mês, e, por meio de uma amostragem, analisa 3,6 mil delas. É medido então o ponto de impacto, ou seja, o número de manifestações positivas que geraram engajamento (compartilhamento ou comentários). Bolsonaro teve um ponto de impacto de 30 mil em junho e passou para 350 mil em agosto. O problema é que o ponto de impacto negativo, ou seja, as manifestações contrárias ao candidato que também geraram engajamento, mostraram uma evolução na mesma proporção, da ordem de 1.000%. A cada ação sua se desencadeia uma reação da mesma intensidade no sentido contrário, o que sugere estabilidade.

Piauí
Pensa grande o governador do Piauí, Wellington Dias (PT), que andou em voga nos últimos dias em função do escândalo do pagamento de postagens nas redes sociais, trapalhada ao que tudo indica de autoria de correligionários mineiros do petista. Em sabatina que deu a uma emissora local este mês, disse que aceitaria "cumprir a missão" de ser o candidato a presidente da República pelo PT, caso esta tivesse sido a opção da cúpula do partido.

Dias é favoritíssimo para conseguir a reeleição em outubro. Pesquisa do Ibope deste mês (margem de erro de 3 pontos, 812 entrevistas de 18 a 20 de agosto, registro no TSE BR-00028/2018) mostrou-o com 47%. A soma de seus rivais é 30%, o que é um indicador de que Dias não tem motivação para cruzar a legalidade e turbinar as redes. Uma de suas principais realizações é pagar o salário do funcionalismo em dia.

O que chama a atenção é o modo como o petista construiu sua hegemonia no Estado. Wellington Dias foi o primeiro petista a se tornar governador, em 2002, e desde então conquistou três mandatos. Ele sempre repartiu poder com políticos tradicionais do Estado. Chegou ao poder com o apoio do PMDB. Reelegeu-se em 2006 aliado ao empresário João Vicente Claudino, do PTB. Voltou em 2014 escoltado por Ciro Nogueira, do PP e este ano manteve esta aliança e acrescentou o MDB na parceria.

Sustenta-se nas estruturas do interior, e não da capital. Teresina é um eterno feudo tucano e Dias perdeu de forma constrangedora a eleição de 2012, quando conseguiu apenas 14% dos votos para prefeito.

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