sexta-feira, 11 de fevereiro de 2022

Entrevista: “Há ilusão de ótica, pois são a segunda via”, afirma Lavareda

Para Lavareda, candidatos à direita disputam o controle da segunda via e devem ter clareza de que o adversário principal é Bolsonaro, sem desperdício de energia com ataques a Lula

Por Cristian Klein / Valor Econômico

Rio - A seguir os principais pontos da entrevista do presidente do conselho científico do Instituto de Pesquisas Sociais Políticas e Econômicas (Ipespe), Antonio Lavareda:

Valor: Qual é a chance dos candidatos da terceira via?

Antonio Lavareda: Terceira via significa, de saída, um formato triangular, e hoje estamos próximo disso. Na verdade, temos mais. Nos votos válidos, há quatro candidatos [Lula, Bolsonaro, Moro e Ciro] com mais de 10%. Isso já configura quatro candidatos competitivos, ou seja, com mais de dois dígitos. Hoje há um formato quase quadrangular.

Valor: Não temos um quadro de polarização?

Lavareda: Pode ser um formato quadrangular, como tivemos nas eleições de 1989 e 2002. As pesquisas estão batendo na trave. Eu desconfio que vai ser reduzido para um formato triangular, como foi em 1998, 2010, 2014 e 2018, havendo risco de ir para o formato bipolar, como ocorreu em 1994 e 2006. Acredito que a lógica do segundo turno vai se impor, vai se imiscuir no final da disputa do primeiro turno.

Valor: Que fatores prejudicam a terceira via?

Lavareda: Qual é a plataforma que impulsiona a candidatura de Bolsonaro? É a incumbência, que é o magneto do debate público. Qual é a plataforma que impulsiona Lula e o lulismo? É a ex-presidência.

Candidatos atacam Lula e Bolsonaro. Mas não estão disputando com os dois. O adversário deles é o bolsonarismo

Valor: Como os concorrentes podem se destacar numa eleição tão baseada nesse voto retrospectivo?

Lavareda: Mais que desafio, o problema dos candidatos da terceira via é que, para protagonizarem a disputa eleitoral, eles ficam batendo à direita e à esquerda. Atacam Bolsonaro e atacam o Lula. Esses ataques nem sempre desgastam os dois candidatos, mas com certeza atraem a ira dos eleitores desses dois candidatos.

Valor: É o caso de Moro.

Lavareda: Logo mais, ele vai conseguir ser o campeão em rejeição, óbvio, está indo nessa direção. Em geral, quando um candidato ataca outro com uma densidade eleitoral bem superior à dele, o efeito mais visível é a elevação da rejeição do candidato de menor dimensão. Isso é praticamente uma regra, não sei como os marqueteiros desse povo não sabem disso. Quando o candidato que tem 2% ataca o que tem 42%, a credibilidade dele já é baixa... A credibilidade decorre do tamanho, da expressão. Ataque é sempre uma coisa delicada em campanhas eleitorais, porque pode ter efeito “backfire”, bumerangue.

Valor: Qual é a alternativa?

Lavareda: Ataque de candidato nanico é um risco imenso. Tem que terceirizar, sair por outro canal, não por ele. Candidato em patamar modesto tem que fazer discurso positivo, atrair o eleitor pelo que tem a contribuir ao debate público. Ainda não tem musculatura para boxear com os líderes.

Valor: E o Doria?

Lavareda: O Doria parou de fazer isso. O pessoal dele, provavelmente, olhou as pesquisas e entendeu que não era hora de atacar, mas de crescer. Não vai crescer atacando.

Valor: Já o Ciro ataca todos.

Lavareda: O problema do Ciro é que era o candidato para liderar a esquerda no segundo turno e quando Lula volta, após decisão do STF, ficou encurralado. Aí ele foi à direita, à centro-direita, passou pelo centro, agora é candidato rebelde, ficou em situação difícil do ponto de vista de posicionamento. Ciro deixou de competir como um banco, com estratégias mais tradicionais e abrangentes, e passou a adotar estratégia de nicho, como uma fintech. Você vê a Simone Tebet. Mais da metade dos brasileiros não a conhecem. Como ela vai crescer? O Alessandro Vieira, o Felipe d’Avila, o Rodrigo Pacheco, que praticamente está saindo da competição... Então, esses candidatos têm extrema dificuldade.

Valor: Que marca tem a eleição?

Lavareda: Esta eleição está ratificando o que se deu em 2018. Primeiro, que o eleitorado à esquerda é do PT. Em seu pior momento o partido conseguiu manter a liderança desse segmento. Segundo, houve uma troca de guarda no voto do centro para a direita. A representação que era tucana foi empalmada pelo bolsonarismo. E isso está se mantendo agora. Ou seja, o PSDB está correndo o risco de desaparecer como ator relevante da representação desse campo do espectro político-ideológico. Bolsonaro no segundo turno é a consolidação disso. Essa centro-direita vai ficar subordinada eleitoralmente ao Bolsonaro num eventual segundo turno.

Valor: Ciro pode ser considerado terceira via?

Lavareda: Eu tiro o Ciro Gomes disso. Ele é a quarta via. Ele é o supletivo da esquerda, o cara que se o Lula amanhã, por qualquer motivo, desistisse da eleição, boa parte da votação dele iria para o Ciro. Ele é a segunda opção de uma porção grande dos eleitores do Lula.

Valor: E os demais candidatos?

Lavareda: Na verdade, eles não são terceira via. O intuito deles é substituir a segunda via, a representação desse campo político-ideológico [à direita], que hoje é Bolsonaro, e, entre 1994 e 2018, foi exercida pelo PSDB. A lógica deles é desalojar o Bolsonaro do segundo turno. E é uma tarefa hercúlea você desalojar um incumbente - e sobretudo um incumbente que foi votado por eles. O Doria tenta retomar para o PSDB. E ainda que não seja para o PSDB, eles querem alguma coisa desse campo político que não seja o Bolsonaro.

Valor: O alvo deles está errado?

Lavareda: É uma ilusão de ótica dos candidatos, dos proponentes e dos patrocinadores da terceira via imaginarem que essa terceira via é algo que entra, investe ao centro do espectro, entre o lulismo e o bolsonarismo. Não é. Não são o centro equidistante, são centro-direita. A única chance é de substituir o bolsonarismo. Em suma, precisam ter a clareza de que o adversário deles é Bolsonaro, é quem controla os votos que poderiam ser deles. Eles têm que enfrentar o Bolsonaro. Mas atacam Lula e Bolsonaro. Não estão disputando com os dois. Lula, eventualmente, será adversário no segundo turno. É a lógica das primárias nos Estados Unidos, em que estariam disputando duramente a indicação do partido que controla esse campo.

Valor: Ciro tem chance?

Lavareda: A maior oportunidade do Ciro - ou para qualquer outro nome, partido ou força política que quisesse ultrapassar o PT à esquerda - passou, que era em 2018.

Valor: Não era também a grande oportunidade do Moro, que estava no auge da popularidade?

Lavareda: O Moro teria sido imbatível em 2018, ganhava no primeiro turno. É candidatura que chega tardiamente. Mesmo assim, ele saiu do ministério em abril de 2020, com até 15% de intenções. Se tivesse ficado no Brasil, fazendo política, pré-campanha, talvez tivesse numa melhor situação hoje. O Moro é o Ciro Gomes do Bolsonaro.

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Parece que ninguém tem chance nenhuma,é Lula e Bozo no segundo turno.