O Estado de S. Paulo
Bolsonaro fala uma coisa, o Itamaraty faz outra. Neutralidade ou equilíbrio?
O mundo acompanha, estupefato, a dicotomia
insana do Brasil diante da invasão russa na Ucrânia, que terá drásticas
consequências por toda a parte. O presidente Jair Bolsonaro diz uma coisa, o
Itamaraty faz outra. Ele anuncia “solidariedade” à Rússia e “neutralidade”, mas
o Brasil votou contra a Rússia na ONU e o chanceler Carlos França corrigiu
ontem na Globonews: a posição do Brasil “é de equilíbrio, não de neutralidade”.
Uma vez negacionista, sempre negacionista, e o Brasil tem o azar, ou a imprudência, de ter um presidente que deu de ombros para a pandemia, as vacinas, as enchentes na Bahia, a Amazônia em chamas, a Educação e a Cultura e agora trata de forma rasa, com uma ligeireza espantosa, uma guerra que atinge todo o mundo e terá altos custos para os brasileiros.
Assim como o ex-chanceler Celso Amorim, do
PT, classifica a reação do Brasil à guerra como “esquizofrênica”, o
ex-embaixador em Washington Rubens Barbosa, da era tucana, define como
“dicotomia”. Apesar das sabidas divergências entre eles, ambos estranham as
manifestações de Bolsonaro, mas concordam com as notas oficiais e votos do
Itamaraty na ONU.
Bolsonaro não diz coisa com coisa, mas o
Itamaraty pediu em nota o fim das “hostilidades” e a missão brasileira na ONU
votou a favor da resolução do Conselho de Segurança que condenava a ação russa
– derrubada pelo veto da própria Rússia. Ontem, a missão ratificou na
assembleia emergencial o respeito ao direito internacional, à integridade
territorial e à soberania da Ucrânia, com cessar-fogo imediato.
Por outro lado, o Brasil discorda do envio
de armas pelos europeus e americanos à Ucrânia e das sanções econômicas e
diplomáticas que atingem a Rússia em várias frentes. Isso não é neutralidade,
é, repetindo o chanceler França, uma “posição de equilíbrio”.
Enquanto o antecessor Ernesto Araújo era
mais realista do que o próprio rei, radicalizando e amplificando os erros de
Bolsonaro, França tenta amenizar, convencer, dar alguma racionalidade à
“esquizofrenia” ou “dicotomia”. E tem aliados no Planalto, como o almirante da
ativa Flávio Rocha, da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), que se
encarrega de “tourear” o chefe contra as maluquices.
Assim, o presidente da Ucrânia agradece ao
Brasil pelo voto na ONU, mas o representante do País aqui, Anatoliy Tkach, diz
que Bolsonaro “está mal informado”. O problema? Quem define a política externa
é o presidente. Que, assim como foi grosseiro com a primeira-dama da França, a
ex-presidente do Chile e o atual presidente da Argentina, chama Zelenski de
“comediante”, por sua profissão. Oremos!
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