O Globo
Bolsonaro, que não esconde sua admiração
por déspotas como Putin e MSB, acha que pode repetir aqui os métodos russos e
sauditas com agressões como a que fez a Vera Magalhães
Há 20 anos, o jornalista Tim Lopes, da TV
Globo, foi sequestrado, torturado, morto e carbonizado no alto do morro da Vila
Cruzeiro, no bairro da Penha, Rio de Janeiro, por traficantes liderados por um
bandido inescrupuloso chamado Elias Maluco. Poucos anos depois, uma repórter do
GLOBO foi perseguida e ameaçada de morte por milicianos da Zona Oeste. O
assédio e as ameaças foram de tal ordem que a jornalista teve que sair de casa
com marido e filho, deixar o Rio e, por um ano, viver exilada em outro estado.
Foi a única forma encontrada para preservar a sua vida e a de seus familiares.
Tanto Tim Lopes quanto a repórter do GLOBO, que depois voltou ao Rio e reassumiu suas atividades, foram objeto da ira de pessoas ameaçadas pelo trabalho de ambos. Tim filmava com câmera escondida a ação dos traficantes nas ruas da Penha. A repórter que se exilou cobriu exaustivamente a CPI da Milícias, a mesma que resultou na escolta permanente que o então deputado estadual Marcelo Freixo, presidente da comissão, passou a usar desde aquela época.
Os dois jornalistas simplesmente cumpriam
com rigor o seu trabalho. Da mesma forma que Vera Magalhães cumpre com o seu.
Em diversos outros pontos do Brasil, jornalistas são xingados, perseguidos,
agredidos e mortos por grileiros, garimpeiros, madeireiros ilegais e diversos
outros tipos de criminosos que não querem ser denunciados. Jornalistas são
também vítimas de políticos de pequena estatura flagrados com a mão da botija
pública no interior do país. O episódio envolvendo Vera inaugura um novo tipo
de assédio a repórteres. Saem da equação os pés de chinelo e entra o presidente
da República.
Todos sabem que foi Jair Bolsonaro que deu
início aos ataques a Vera quando, durante o debate da Band, disse que ela era
“uma vergonha para o jornalismo brasileiro” (um parêntese aqui: Bolsonaro não
entende nada de jornalismo e de jornalistas; Vera é uma dos melhores quadros da
imprensa nacional). A frase do presidente viralizou nas redes, foi reproduzida
no alto de um guindaste no 7 de Setembro de Copacabana, ao lado da foto da
jornalista, e transformou-se em assédio direto feito pelo deputado Douglas
Garcia.
Jornalistas são sistematicamente objeto da
ira de pessoas ou grupos com interesses contrariados, não se trata propriamente
de uma novidade. Nas jornadas de 2013 e nas manifestações a favor e contra o
impeachment de Dilma Rousseff, jornalistas tinham que trabalhar com coletes e
capacetes, como se estivessem cobrindo uma guerra. Mesmo assim, um de nós (o
repórter cinematográfico Santiago Andrade) foi morto por um rojão disparado à
queima-roupa por dois manifestantes. A diferença agora, é que o ataque foi individualizado.
Não que o trabalho dos repórteres seja fácil e seguro nesta campanha, mas agora
o presidente resolveu personalizar seu ataque.
Bolsonaro agiu como um dublê menor e
ridículo de Vladimir Putin. Na Rússia, jornalistas são agredidos, violentados,
calados, censurados e mortos por criticarem o governo. Um único jornal, o
Novaya Gazeta, teve seis mortos em 20 anos. Em pouco mais de duas décadas,
período em que Putin está no comando, 58 jornalistas russos foram assassinados
brutalmente pelo regime. Bolsonaro não é Putin e jamais reunirá tanto poder.
O Brasil tampouco é uma autocracia familiar
como a Arábia Saudita. Lá, o príncipe herdeiro e dono de todo o poder local,
Mohammed bin Salman (MSB), mandou assassinar e esquartejar o jornalista Jamal
Khashoggi, dentro de um consulado saudita na Turquia. O pecado de Jamal foi o
de criticar com veemência MSB. Na Arábia Saudita, os poucos repórteres
independentes que ainda restam são sistematicamente perseguidos, presos,
torturados e eventualmente mortos pelo regime.
O inescrupuloso presidente brasileiro, que
não esconde sua admiração por déspotas como Putin e MSB, acha que pode repetir
aqui os métodos russos e sauditas com agressões como a que fez a Vera
Magalhães. Não pode. O homem que diariamente fala em liberdade não entende
direito o significado desta palavra. Se entendesse, jamais incentivaria o ódio
contra jornalistas, os porta-vozes da liberdade.
Corrida por verba
A inversão de valores produzida pelo
Orçamento Secreto é tamanha que esta semana um jornal publicou o seguinte
título para uma nota inusitada: “Ministérios correm ao Congresso para recompor
cortes no Orçamento de 23”. Pode? Claro, agora é obrigatório. O curioso é que
os cortes que os ministros querem agora recuperar foram feitos pela Casa Civil,
de Ciro Nogueira, líder do Centrão destacado para operar no Palácio. Significa
o seguinte: o Centrão corta e depois o Centrão recompõe, com as recompensas de
sempre.
Jogo sujo
A campanha de Bolsonaro agora tenta afastar
os católicos de Lula. Mentiras em série espalhadas nas redes sociais dizem que
Lula vai perseguir padres e bispos como fazem todos os comunistas. A presença
do PT é tão sólida na Igreja Católica, com amplo apoio de todas as comunidades
eclesiais, que a nova fake bolsonarista parece piada.
Com Ipsilone
Depois do Kassio com K, que não gosta do
nome e pediu para ser chamado apenas pelo sobrenome Nunes Marques no STF, eis
que surge uma mulher que não se toca nestas coisas. A candidata do União
Brasil, Soraya Thronicke, faz campanha na TV salientando sempre que seu nome é
Soraya com ipsilone. Puro apego à letra exótica, porque isso não faz a menor
diferença para o eleitor na hora de digitar seu voto.
Mais um
Em quatro meses, três líderes indígenas
Guarani-Kaiowá foram assassinados em Amambaí, no Mato Grosso do Sul. Uma quarta
pessoa da mesma etnia foi morta neste período, mas a “eficiente” polícia local
já disse que esta foi vítima de crime passional. Trata-se de uma menina de 13
anos que teria sido assassinada por um rapaz de 17 anos. As outras vítimas são
parte de novos casos insolúveis por absoluta incompetência ou desinteresse
policial. Ou alguém aqui acha que é muito difícil identificar assassinos que
operam em série numa cidade de 39.826 moradores? Amambaí tem pouco mais de cem
ruas, 12.228 domicílios, nove escolas municipais, seis estaduais e sete
creches, dois hospitais privados e sete postos de saúde, uma delegacia, 350 mil
bois, 44 mil porcos e 70 mil hectares cultivados. A população de Amambaí é
menor do que a de Ipanema.
Muito tarde
Tem quem compre, mas esta profusão de
pedidos de desculpas e manifestações de indignação contra o mastodonte que
agrediu Vera Magalhães não convence. De repente, até o zerinho deputado virou
gente boa. Fala sério. E uma frase do candidato Tarcísio de Freitas é risível.
Ele disse: “Esse tipo de gente não merece estar do nosso lado”. Fosse sincero,
Tarcísio teria de se afastar de Bolsonaro, autor da frase repetida por Douglas
Garcia e o primeiro a agredir verbalmente a jornalista. Mas claro que não vai
fazer isso, ele ainda sonha com uma vaga no segundo turno e acha que o capitão
pode ajudar.
‘Ajudadora'
Esse tipo de gente que Tarcísio finge
criticar é por essência misógina. Desse grupo faz parte Michelle Bolsonaro, que
esta semana disse que “mulher é ‘ajudadora’ do esposo”. Segundo o Aurélio,
“ajudador” é aquele benzedor chamado em casas do sertão brasileiro para
assistir a um moribundo. Ele ajuda, com rezas e incensos a “salvar” a alma do
enfermo prestes a morrer.
Preocupado com o circo
Jair Bolsonaro está preocupado com o
desempenho de Ciro Gomes, estacionado nas pesquisas e que pode ainda
desidratar. A campanha do presidente, que vê num hipotético esvaziamento do
pedetista uma alavanca para Lula ganhar no primeiro turno, estuda como pode
ajudar a segurar os eleitores com o candidato trabalhista. Alguns ministros já
começaram a elogiar publicamente o adversário. Fábio Farias usou as redes
sociais para incensar Ciro. Difícil dizer se este tipo de apoio ajuda ou
atrapalha ainda mais.
Ciro preocupado
De seu lado, Ciro quer no mínimo manter os
índices atuais, sonha chegar a 10%, mas morre de medo de ser ultrapassado por
Simone. Essa mistura de sentimentos é a que embala sua ambição de assumir o
protagonismo do antilulismo em 2026. Seu cálculo é simples. Derrotado, Bolsonaro
derrete e se pretender voltar terá garantido ao seu lado apenas os radicais da
extrema-direita. Caberá então a ele, Ciro, buscar o espectro que vai do centro
à direita. Por isso, desce o pau em Lula.
Cabeça desencaixada
O inacreditável Paulo Guedes saiu-se com essa ao explicar que o governo pode reverter o corte de gastos com remédios para os mais pobres: “É só um desencaixe temporário”. Significa mais ou menos dizer “deixe de tomar seu medicamento temporariamente, depois a gente resolve”.
3 comentários:
Burro e detestável Paulo Guedes, destoa de tudo que é decente. Cúmplice do Bolsonaro na adoração a torturadores.
O bolsonarismo é uma quadrilha de violentos criminosos e milicianos, comandados por um genocida que mente compulsivamente. Seu método é a mentira e a violência, verbal e física.
Absurdos em série...
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