Folha de S. Paulo
Galípolo é um contraponto a certas ideias
petistas; seu substituto, um mistério
A indicação
de Gabriel Galípolo para o Banco Central motivou as especulações de
praxe sobre a política para a taxa de juros, grosso modo. Rendeu muito menos
conversa a nomeação de Dario
Durigan para o lugar de Galípolo,
o de secretário-executivo, vice-ministro da Fazenda de Fernando Haddad.
A desproporção do debate, ou da fofoca, sobre as nomeações não faz muito sentido. Galípolo no Banco Central não vai provocar reviravolta, por vários motivos. O papel de Durigan como vice-ministro da Fazenda é um mistério e a mudança é precoce. Talvez Haddad quisesse ocupar um lugar no BC antes que alguém sugerisse a Lula um nome ruim.
Durigan, 39, graduou-se em direito na USP e
é mestre em direito pela UnB. Sua dissertação de mestrado, "Desobediência
Democrática no Brasil" (2020), é uma discussão atualizada da ideia de
desobediência civil, da perspectiva do contexto brasileiro recente. Até 2020,
fez carreira no serviço público, em assuntos jurídicos. Desde então, trabalha
na área de relações institucionais do Meta/WhatsApp.
Essa formação não é demérito. Mas nada tem
a ver com economia, na teoria ou na prática. Durigan pode ser um articulador
político, com experiência nas burocracias do estado, em particular em seus
meandros jurídicos. Foi escalado na mesma posição de Galípolo, mas função
tática e habilidades são outras. Por ora, uma incógnita.
Galípolo é um contraponto às ideias
econômicas mais anacrônicas e equivocadas do petismo. Opõe-se a tabelamentos,
decretos de intervenção em atividade econômica ou estatais, desestatizações
equivocadas. Sugere incentivos ao investimento privado. É a favor de algum teto
de gastos (como é o dito arcabouço fiscal). Presidiu um banco pequeno, o Fator,
e foi consultor de concessões e parcerias público-privadas.
Tem a simpatia de Luiz Inácio Lula da Silva
e se dá bem com as lideranças de centrão e da Câmara, inclusive
com Arthur Lira (PP-AL). Já antes de ir para o governo, era muito ouvido
por Haddad, em especial sobre mercados financeiros, assuntos fiscais e
investimentos.
A julgar pelos preços da praça financeira,
os donos do dinheiro na finança deram de ombros para as nomeações, até agora,
pelo menos.
Ainda que Galípolo fosse ou vá compor a
"bancada governista" no BC, será muito minoritário até fins de 2024,
ao lado do outro indicado, Ailton
dos Santos, uma incógnita e funcionário de carreira da instituição. De
qualquer modo, sabe que o trabalho no BC não é o de "virar voto" ou
causar tumulto. É preciso persuadir; há limites institucionais (metas de
inflação e suas implicações técnicas ou argumentativas) e a finança para tourear.
E não é só isso.
É muito difícil dizer se a Selic deveria
estar em 14% ou 13,25% ao ano, mesmo se fosse possível abstrair o contexto
político. Ou dizer se a taxa
básica deve terminar o ano em 13,75%, presente caso da direção do BC,
ou 12,5%, como está em previsões de economistas do setor privado ou indicam as
taxas de juros da praça.
Quanto menos dúvida houver sobre o
crescimento da dívida pública ou sobre metas de inflação, por exemplo, menos
improvável que a Selic termine este 2023 mais para baixo. Na ponta do lápis do
BC, fica em 13,75% até perder de vista. Mas até essa perspectiva dura pode ajudar
a conter expectativas de inflação e facilitar a queda de juros, tudo mais
constante. De qualquer modo, note-se, não vão ser esses pontos de percentagem
que farão o país crescer mais, nem mesmo no curto prazo.
Galípolo pode até mudar a perspectiva da
discussão. Mas não tem muito como escapar desse campo de jogo. Claro que, se
Lula fizer uma maioria heterodoxa aloprada no BC de 2025 (ou indicar que vai
fazê-lo), tudo muda. Para começar, haveria um tumulto tão grande que o tiro
sairia pela culatra.
Pode bem acontecer. Mas não é a
perspectiva, agora. Interessante é saber o que Haddad pretende, na Fazenda e,
mais adiante, no BC.
Um comentário:
Dissertação de mestrado.
Tese de doutorado.
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