Correio Braziliense
Flávio Dino se tornou uma estrela do governo
Lula, mas está no epicentro do estresse de relacionamento entre o presidente da
República e o presidente da Câmara, Arthur Lira
O ministro da Justiça, Flávio Dino,
ex-governador e senador eleito, que se diz católico apostólico romano, recorre
aos ensinamentos do líder comunista George Dimitroff para explicar a
necessidade de o governo Lula chegar a um acordo com o Congresso para governar.
“Estamos na defensiva, houve um avanço do fascismo no mundo e o bolsonarismo
faz parte disso, aqui no Brasil”. Mesmo que Jair Bolsonaro venha a ser
considerado inelegível, segundo ele, o “bolsonarismo continuará existindo”.
Seria essa, na sua opinião, a grande ameaça enfrentada pelo governo Lula, que
justifica a “adoção de um programa mínimo e não um programa máximo”, como a
esquerda do próprio governo gostaria.
Ex-juiz criminal em Brasília, Flávio Dino derrotou o clã do ex-presidente José Sarney para ser governador do Maranhão por dois mandatos, eleito pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Na última eleição, quando concorreu ao Senado, trocou de legenda e passou a fazer parte do PSB. Já foi convocado uma dezena de vezes para depor em comissões do Senado e da Câmara. Seus embates viralizaram nas redes sociais, um deles com o senador Marcos Do Val (Podemos-ES), seu principal desafeto. É acusado pela oposição de ter se omitido quanto à segurança da Esplanada dos Ministérios no dia 8 de janeiro passado, quando o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF) foram invadidos e depredados por vândalos de extrema-direita.
“Houve uma tentativa de golpe de Estado,
mas querem transformar a vítima em réu”, argumenta. O ministro da Justiça já
foi alvo de ameaças de morte e tentativas de agressão, em várias situações, uma
das quais mum shopping de Brasília, quando estava com a mulher e dois filhos.
“Ando com segurança 24 horas por dia, porque sempre sou atacado por
bolsonaristas, mas não tenho medo do fascismo, vou cumprir minha missão”, garante.
Seus embates estão tendo o efeito de aumentar sua popularidade, principalmente
entre os jovens, o que o torna um potencial candidato à Presidência. Ele
descarta: “meu candidato em 2026 é o presidente Luiz Inácio Lula da Silva”.
Ao defender um programa mínimo,
“antifascista e nacional-desenvolvimentista”, Flávio Dino estabelece um
paralelo entre o governo atual e o governo de Juscelino Kubitscheck, que também
enfrentou tentativas de golpes militares, até para tomar posse, após eleito por
um bloco de alianças no qual predominavam liberais (PSD), trabalhistas (PTB) e
comunistas (PCB). Tanto a concepção de antifascismo da época quanto a agenda
nacional-desenvolvimentista dos comunistas se baseavam nas teses apresentadas
pelo líder comunista búlgaro George Dimitroff, no 7º Congresso da Internacional
Comunista, em 1935, em Moscou, em resposta à ascensão do fascismo na Itália, do
nazismo na Alemanha e ao militarismo japonês.
O centro da política dos partidos
comunista, a partir de então, seria defender a democracia e a unidade da
esquerda contra o fascismo. Todas as dissidências comunistas que surgiram após
a dissolução da Internacional Comunista, em 1947, decorreram de divergências em
relação ao informe de Dimitroff, inclusive o próprio PCdoB, fundado em 1962, por
uma dissidência do antigo PCB que adotou as teses maoístas. A frustrada
guerrilha do Araguaia, na década de 1970, durante o regime militar, foi
inspirada na Revolução Chinesa. Ex-dirigente dessa legenda, Flávio Dino defende
a tese de que o governo Lula deve trabalhar com um programa que tenha apoio da
maioria do Congresso, não apenas da esquerda, e permanecer na defensiva em
razão da correlação de forças políticas existente no país.
Estresse com Lira
“Lula está fazendo um governo mais ou menos
como o de Juscelino, inclusive em relação à indústria automobilística”,
exemplifica. Esse é o xis da questão, do ponto de vista político, a ideia de
que a defesa da democracia é o que unifica a frente ampla formada para derrotar
Bolsonaro, por 1,8% dos votos, apenas, é mais do que justa. Entretanto, não se
aplica à agenda econômica nacional-desenvolvimentista, considerada ultrapassada
por esses mesmos setores de centro, devido ao esgotamento do modelo de
substituição de importações. Em economês, adensar demais as cadeias produtivas
da indústria pode ser uma tragédia em termos de produtividade e
competitividade, e restringir a integração da economia brasileira às cadeias de
produção globalizadas. Trocando em miúdos, produzir carros populares movidos à
gasolina quando o mundo está produzindo carros elétricos cada vez mais baratos
é ficar para trás.
Flávio Dino se tornou uma estrela do
governo Lula, mas está no epicentro do estresse de relacionamento entre o
presidente da República e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), por
causa da operação da Polícia Federal em Alagoas contra corrupção no MEC, na
qual foi detido um assessor do poderoso líder do Centrão. Convidado por Lira,
Dino foi à residência oficial do presidente da Câmara e explicou que a
investigação foi iniciada durante o governo Bolsonaro, o mandado de busca e
apreensão foi expedido por um juiz local e executado por um delegado da polícia
federal que sequer sabe o nome, só tomou conhecimento da operação quando estava
ocorrendo.
Segundo a ministro da Justiça, era sua obrigação dar os esclarecimentos a Lira, que em nenhum momento pediu que interferisse no caso. “Quem me conhece, jamais faria isso”. Nosso personagem é um potencial candidato a presidente da República caso Lula não queira ou não possa disputar a reeleição. Não fala isso com todas as letras, mas deixa no ar. O problema é que a concorrência é grande, inclusive dentro do governo, que tem quatro ex-candidatos a presidente da República, um dos quais de seu atual partido: o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB). Os demais são o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), a ministra do Planejamento, Simone Tebet (MDB), e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (Rede).
Um comentário:
Verdade.
Postar um comentário