sábado, 16 de dezembro de 2023

Marcus Pestana* - A convivência entre os poderes republicanos

O Brasil optou, em 1889, por uma organização republicana com o fim da monarquia, e, sob clara influência do processo norte-americano, a República já nasceu presidencialista.

Para um país de 523 anos de existência, nossa experiência democrática é curta. Da descoberta até 1888 tivemos uma sociedade escravista. Da proclamação da República até 1930, experimentamos uma democracia restrita ao jogo das elites regionais. Com a Revolução de 1930, tivemos pela primeira vez um Código Eleitoral na tentativa de moralizar o sistema político. Em 1934, foi introduzido o voto feminino.

Já em 1937, caímos na ditadura do Estado Novo, que perdurou até o final da Segunda Grande Guerra. A vitória das forças aliadas impôs a redemocratização no Brasil. Da eleição de Dutra até 1964, tivemos o período mais vivo de nossa democracia. Havia a presença ativa dos trabalhadores nas lutas políticas e sociais, a classe média começava a vocalizar seus interesses e o país experimentou um período dourado de crescimento combinado com amplas liberdades.

A experiência democrática foi interrompida pelo Golpe Militar de 1964 e um longo período autoritário se instalou até 1985, quando Tancredo Neves foi eleito, por via indireta, Presidente da República, iniciando o processo de redemocratização coroado pela promulgação da Constituição de 1988 e inaugurando o mais longo e profundo período democrático de nossa história, que completará 39 anos em 2024.

Mas, como disse Otávio Mangabeira: “nossa democracia é uma planta tenra, que precisa ser regada e cuidada sempre, sob risco de não sobreviver”. E para isso são decisivas a independência, autonomia e harmonia entre os três poderes republicanos, parte essencial do sistema de freios e contrapesos, já que a democracia é uma invenção humana, e, portanto, imperfeita, precisando de regras de desconcentração do poder e de compensações para as naturais falhas dos homens no poder e das instituições que encarnam a organização de determinada sociedade humana. Isto remonta ao pensamento de Aristóteles, na Grécia Antiga, e dos iluministas John Locke e Montesquieu, no nascimento das democracias modernas.

Esta semana o Senado Federal aprovou o nome do ex-juiz, ex-governador, atual senador e ministro Flávio Dino para a nossa corte constitucional, guardiã de nossa Lei maior. Paralelamente, foi aprovado o nome de Paulo Gonet para a Procuradoria Geral da República. Como sempre, o ambiente foi carregado de polêmicas e controvérsias políticas, já que não há processo neutro e perfeito de nomeação.

O essencial é que após o período de intensa polarização e confrontação entre os Poderes Executivos, Executivo e Legislativo, haja um período de pacificação e diálogo, com cada um se atendo a sua órbita de atuação. O Judiciário deixando o ativismo e de legislar nos vácuos deixados, evitando invadir o terreno da execução das políticas públicas e valorizando o princípio da colegialidade. O Legislativo não querendo imobilizar o Executivo e tutelar o Judiciário, como na ideia estapafúrdia de revisão parlamentar de decisões judiciais. E o Executivo moderando o uso de medidas provisórias e decretos em casos que caberia ao Legislativo e evitando a confrontação com decisões das Cortes superiores.

Assim conseguiremos assegurar muitas décadas de vida para a democracia brasileira.  

*Economista e Professor. Ex-Deputado Federal pelo PSDB-MG. Secretário de Estado de Saúde de Minas Gerais (2003-2010). Diretor-Executivo do IFI – Instituição Fiscal Independente do Senado.


3 comentários:

Daniel disse...

Muitas décadas de democracia no Brasil? Só se Jair Bolsonaro for julgado e condenado por seus crimes! Sem isto, nossa democracia estará sempre ameaçada pelo ex-presidente criminoso e ainda quase não responsabilizado por tantos ataques ao sistema democrático.

Anônimo disse...

■■■Os dois populismos ameaçam a democracia no Brasil:: o populismo ligado ao lulismo e o populismo ligado ao bolsonarismo!
■É cinismo negar que estes dois grupos populistas, seus líderes Lula e Bolsonaro e os que a eles se agregam atuam na política internacional em conjunto com ditadores, terroristas e autocratas.

No Brasil, os dois populismos atuam sempre com o que há de pior no fisiologismo e nunca buscam, a não ser quando precisam de disfarce, uma atuação mais próxima dos grupos políticos mais democráticos, e mesmo assim apenas para usá-los. E há, sim, membros de grupos democráticos que se prestam a serem usados em troca de alguma vantagem pessoal pelos que não têm nenhum compromisso com a democracia.

■No caso de Lula o descompromisso com a democracia fica ressaltado pelas agressões indevidas que volta e meia Lula faz contra os países democráticos e pela sua articulação direta com Xi Jiping e Vladimir Putin por uma Ordem Internacional autoritária;
■No caso de Bolsonaro, teve a relação direta de Bolsonaro com o torturador Carlos Brilhante Ustra dentro da ditadura de 1964 e a escaramussa iniciada em forma de vandalismo nos atos do dia 08 de janeiro.

Os dois populismos falam em democracia o tempo todo, mas basta algum líder realmente democrático, como Gabriel Boric, presidente do Chile, afirmar sua essência democrática, que os populistas lulistas exercem seu autoritarismo e permanente policiamento para xingar, agredir e constranger democratas, mesmo quando são claramente posicionados ideologicamente à esquerda, ou talvez exatamente por isso.

Em ciência política, um termo oposto a DEMOCRACIA é hegemônico.

■■■Não há nada melhor em uma democracia para identificar se um grupo antidemocrático está atuando de modo a usar a democracia em seu proveito para depois suprimí-la que a prática do hegemonismo.
■■No Brasil, quem claramente pratica hegemonismo, em prejuízo do exercício da política democrática, é.........
(Os pontinhos ficam para os que quiserem preencher, seja de forma sincera seja de forma desonesta, como desonesta é a corrupção com dinheiro público, que tanto tira de hospitais, escolas, não sendo uma prática de nenhum grupo democrático.

Anônimo disse...

Hegemonia ≠ Democracia.