quarta-feira, 20 de maio de 2009

O risco de os pés entrarem pelas mão

Rosângela Bittar
DEU NO VALOR ECONÔMICO

Esta é uma fase em que tudo parece dar errado e, sem uma liderança incontestável, forte o suficiente para ter ascendência sobre diferentes facções do partido, não há clareza sobre como será o futuro político próximo e de que maneira chegará lá o PT. O que um partido como este pode fazer nesta circunstância, é uma incógnita, até para a cúpula. Tem demais a perder, e não parece disposto a esperar sentado por um comandante, alguém que possa levá-lo ao porto seguro da manutenção do poder. Pode sair, e parece que já está, atirando para todos os lados.

Pode explorar polos que vão do terceiro mandato para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao vale tudo para desorganizar o recentemente aprumado adversário. Nada lhe assegura certezas nem o fim em bom termo.

Não se trata de um momento semelhante ao que o PT viveu no mensalão, quando seus principais políticos em posição estratégica, no controle do poder nacional, inclusive aquele que o presidiu durante anos até levá-lo à Presidência da República, recolheram-se, abatidos em suas posições de evidência. À época ainda tinha muito tempo para reequilibrar-se, e conseguiu.

Agora é diferente. O PT está no poder, ocupa a máquina pública - há uma estimativa de que estejam com o partido, na veia, 80 mil cargos -, tem as rédeas dos principais instrumentos de governo, como os fundos de pensão, por exemplo, e como já detinha postos de comando em muitas áreas estratégicas da administração federal mesmo antes de assumir a Presidência da República, nada autoriza a conclusão de que tudo perderá se por acaso ficar fora dela por quatro anos. Ao contrário, todos os partidos têm consciência de que se há algo impossível na alternância de poder, hoje, será desalojar o PT do aparelho.

O medo, porém, cresce com a eclosão de novos riscos, leva a situações agudas, como o nervosismo que assoma o partido neste momento e, por sua vez, leva à troca dos pés pelas mãos.

O partido vem mesmo passando por alguns abalos. A doença da ministra Dilma Rousseff, chefe da Casa Civil e candidata declarada do presidente Lula a sucedê-lo, é o mais forte. Demorou o PT a absorver a indicação mas, uma vez que a aceitou, tomou como sua, preparou agendas estratégicas e passou a ver possibilidade real de êxito da candidatura. Agora, precisou adaptar-se ao aparente revés da doença.

Por mais que saiba que dentro de dois anos a saúde da ministra pode estar cem porcento, os retrocessos da candidatura neste momento desequilibraram o partido. Saiu às cegas para uma guerra particular com o PMDB nos Estados, onde tem e até onde não tem as melhores chances; dilacerou-se para arquivar o pedido de reintegração do executivo do mensalão aos quadros partidários; apavorou-se com a CPI da Petrobras; antecipou, mesmo com o discurso inverso, a volta do debate sobre o terceiro mandato consecutivo para o presidente Lula, algo esperado apenas para o segundo semestre de 2009; e, diante de um acerto preliminar na principal seara adversária, uma trégua com adiamento da disputa da candidatura presidencial do PSDB, atiçou novamente os contendores, a partir de uma estratégia do núcleo petista de Minas, um dos que mais sofrem com a situação política sufocante.

Da alta cúpula do PSDB, aos dois candidatos principais do partido à presidência e seus representantes mais credenciados, esclareceram à exaustão, durante 48 horas a partir do último fim de semana, a natureza das duas conversas entre José Serra e Aécio Neves, potenciais candidatos do partido à sucessão de Lula, para formulação de uma estratégia comum de ação nos próximos meses. Combinaram que ambos continuam pré-candidatos a presidente e devem participar juntos de eventos partidários pelo país até o segundo semestre, quando será feita nova avaliação do quadro político. Se não for possível evitar as prévias, vão realizá-la entre dezembro deste ano e fevereiro de 2010. E ficou claro que a chapa puro sangue, para os dois pré-candidatos, será a pior solução. Serra teria melhores chances na candidatura à reeleição, se perder a indicação da prévia, e Aécio mais perspectivas ficando quatro anos como senador. Até o ex-presidente Fernando Henrique, entusiasta da chapa puro sangue, deixou o projeto em banho-maria desde março último, quando a lançou, diante das reações contrários dos protagonistas.

As explicações não foram eloquentes o bastante para evitar o balão da chapa pura levantado pelos adversários, inflado a partir do acordo existente para um que não vingou ainda. Ponto para o PT, com grande efeito sobre o PSDB que, historicamente, se sai mal nestas situações. Está claro o desinteresse do partido no governo pelo que foi combinado nas hostes adversárias, mas é um tiroteio sem comando, de alvo ainda não muito definido, enquanto tenta arrumar a própria casa e encontrar caminhos.

Colhido pela CPI da Petrobras, o PT foi obrigado também a baixar, mesmo que temporariamente, as armas que começara a manejar na disputa com o PMDB pelo lançamento das candidaturas nos Estados. Este assunto foi o mais delicado da reunião do diretório nacional realizada em Brasília, há uma semana, e de tão polêmico, depois de um mapeamento preliminar, acabou nas mãos de um grupo de trabalho, que vai estudar caso por caso, estado por estado e quiçá município por município. O PT não é de abrir mão de candidatura, ao contrário, mas acha que o PMDB extrapola nos ataques que faz aos cargos do governo, às diretorias de estatais, ao direto às candidaturas. Resolveu, então, dar uma "esfriada" no partido, por ironia no momento em que surgia a nova imposição, a CPI da Petrobras, empreitada que exigirá muito da aliança partidária..

O presidente Lula evita queimar seu braço direito Gilberto Carvalho e adia a definição do novo comando do PT. A hesitação piora a instabilidade do partido e a sensação de fluidez da sua perspectiva política. Existem, claro, lideranças ainda na ativa que viram, na última reunião do diretório, em Brasília, maturidade e equilibrio nas poucas decisões tomadas. Estes políticos concordam, no entanto, que ato contínuo voltou a sensação de vertigem.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

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