- O Globo
A presidente Dilma insiste em criticar sua adversária mais próxima, a candidata do PSB, Marina Silva, por supostas mudanças de posição "como se muda de camisa". E sua campanha resolveu copiar a do outro adversário, Aécio Neves, do PSDB, que teve uma bela sacada para alfinetar Marina: disse que seu programa de governo parece ter sido escrito a lápis , numa alusão à facilidade com que é alterado.
A campanha de Dilma explora tanto as erratas feitas por Marina em seu programa que se esquece de olhar as próprias erratas, muito mais graves. O erro do IBGE sobre o combate à desigualdade foi vergonhoso, e não "banal", como a presidente classificou. E ontem a expectativa oficial sobre o crescimento da economia este ano foi revista em nada menos que 50%: caiu de 1,8% para 0,9%. Mesmo assim, é uma previsão super otimista, pois o boletim Focus prevê uma economia crescendo míseros 0,3%. Vem nova errata aí. Os dois adversários, como, aliás, Marina denunciou, estão juntos nesta fase final do primeiro turno na expectativa de derrotá-la: Dilma, porque considera mais fácil vencer o candidato do PSDB, e Aécio, porque está convencido de que quem for para o segundo turno derrota a presidente Dilma.
Tentam recolocar a campanha nos termos em que se sentem mais confortáveis, isto é, polarizada entre PT e PSDB. De fato, tanto Dilma quanto Aécio prepararam-separa mais um embate entre tucanos e petistas, e, com Campos no páreo, tudo indicava que Aécio sedaria melhor , pois tem o apoio de uma máquina partidária mais forte do que a do PSB. Não há indicações para prever se Campos poderia surpreender, transformando-se em um fenômeno eleitoral, mas sua morte transformou a campanha, introduzindo nela um fator emocional de que estava carente. Refiro-me não apenas ao choque que a morte trágica do ex-governador de Pernambuco provocou, mas à própria figura da candidata Marina Silva, que tem um ar mítico que ajuda a lhe dar credibilidade.
É como comentou o jornal inglês "Financial Times" : se Marina representa, ela é uma boa atriz. A entrada de Marina no páreo subverteu as normas políticas não escritas que levariam a disputa para um segundo turno entre Dilma e Aécio, os candidatos que possuem mais esquema partidário, mais máquina eleitoral, mais tempo de televisão para a propaganda oficial. Marina virou tudo de cabeça para baixo, chegando à frente de Dilma até hoje nas pesquisas eleitorais de segundo turno, com apenas dois minutos e pouco de tempo de propaganda e uma máquina partidária pequena, e que, mesmo assim, não responde ao seu comando.
Marina está vencendo em regiões em que as máquinas partidárias do PT e do PSDB são mais fortes, e está conseguindo quebrar um pouco a hegemonia petista no Nordeste. Caso a campanha de desconstrução tenha êxito, ela pode chegar ao segundo turno depauperada, ou nem chegar lá, superada no último momento por Aécio. No primeiro caso, Marina terá o mesmo tempo de propaganda que Dilma para tentar retomar a dianteira, valendo- se do "discernimento " do eleitorado brasileiro para identificar o que classifica de mentiras e distorções do "marketing selvagem " adotado pelos adversários .
Para superar esses problemas, terá que fazer um acordo programático com o PSDB que dê ao eleitor ressabiado a garantia de governabilidade . Em todo caso, o vice Michel Temer já se adiantou a uma eventual derrota para dizer que o apoio a Marina dependerá apenas dela, pois o PMDB sempre se colocou como o garantidor da democracia brasileira, e assim continuará atuando caso a nova presidente queira incluir o partido na sua base. Como o vice de Marina, Beto Albuquerque, já admitiu que "ninguém governa sem o PMDB ", essa questão parece superada.
Caso Aécio consiga superar Marina e vá para o segundo turno , melhorando a performance do PSDB em São Paulo e Minas, resta uma dúvida: ter á condições de recuperar os votos do Nordeste , que hoje estão divididos entre Dilma (48%) e Marina (31%), com os tucanos pegando uma fatia que não chega a 10% do eleitorado? Essa é a conta básica para a disputa do segundo turno , já que a chegada do PSDB de virada poderá concretizar no segundo turno a votação sonhada em Minas e São Paulo, fortalecendo Aécio no Sudeste.
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