• Petrobras submeteu-se à legislação dos EUA ao captar poupança privada em território americano. Agora, ela e os parceiros privados sentem o peso da jurisdição estrangeira
- O Globo
A realidade bate à porta: depois de um ano de investigações sobre corrupção na Petrobras, o governo, a companhia estatal e seus principais fornecedores começam a perceber os riscos a que estão expostos no país e no exterior.
Semana passada, a Presidência da República se mobilizou porque o Tribunal de Contas decidiu apurar a responsabilidade de diretores e conselheiros da empresa, desde 2004, em negócios com prejuízos extraordinários.
O TCU pode ajudar a iluminar um lado obscuro: a cadeia de comando que conduziu a Petrobras ao engajamento — simultâneo e a qualquer custo — numa miríade de transações suspeitas com refinarias, navios, plataformas, boias, sondas e ativos no exterior.
Enquanto isso, anuncia-se uma avalanche de ações judiciais nos Estados Unidos e na Europa.
Dentro das fronteiras nacionais, a Petrobras tem sido qualificada como “vítima”. Lá fora, porém, é vista como “vilã”. Por dois motivos:
1) Alguns de seus principais executivos são reconhecidos protagonistas da corrupção que caracterizou as relações da companhia com empreiteiras e líderes políticos. E, nos EUA, tem prevalecido a lógica da responsabilização de empresas pela conduta de funcionários.
2) Pairam suspeitas de fraudes e maquiagens nas sua contas durante toda a última década.
A empresa brasileira aceitou submeter-se à legislação americana para captar poupança privada no mercado de capitais local. Agora, ela e os parceiros privados sob investigação começam a sentir o peso da jurisdição estrangeira.
Processos foram abertos nos EUA contra a Petrobras, sua auditora financeira e mais 15 bancos nacionais e estrangeiros, intermediários nos lançamentos de títulos a partir de 2005.
Fundos de pensão de Londres e dos estados americanos de Rhode Island, Ohio, Idaho e Havaí responsabilizaram uma dezena e meia de executivos do grupo estatal. E listaram outros 11 “indivíduos relevantes” para as ações — entre eles, a presidente Dilma Rousseff.
A base é a legislação anticorrupção. Com 80 anos, suas premissas são a transparência na contabilidade e a afirmação da jurisdição americana sobre o comportamento de empresas e indivíduos em práticas corruptas com representantes de governos estrangeiros, entidades estatais ou paraestatais, candidatos, dirigentes ou integrantes de partidos políticos.
A lei mira na intenção de quem paga e atinge todas as empresas envolvidas, mesmo as estabelecidas fora do território americano.
No Brasil, até sexta-feira, estavam sob investigação 494 empresas e pessoas — além de 47 senadores e deputados.
Os inquéritos brasileiros dependem da cooperação externa, ao mesmo tempo em que subsidiam iniciativas do Departamento de Justiça e da comissão de valores americana (SEC, na sigla em inglês). Têm peso específico as confissões do ex-gerente da estatal Pedro Barusco e do ex-diretor Paulo Roberto Costa.
A situação é adversa aos interesses da Petrobras. Ainda que obtenha a qualificação de “vítima” de corrupção, a empresa brasileira terá outro problema pela frente — como adverte a advogada Isabel Franco em artigo na revista “Interesse Nacional”, que começou a circular ontem: está sujeita a multas pela forma como as fraudes foram contabilizadas. Um precedente é o bilionário processo de 2001 contra a Enron e sua auditora Arthur Andersen.
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