Apenas 15% dos brasileiros se dizem satisfeitos com a democracia, segundo recente pesquisa do Ibope. Trata-se de um resultado que não condiz com a solidez alcançada pelas instituições democráticas do País três décadas após o fim da ditadura militar. Não faz nem um ano houve eleições no País, em que todos puderam exercer livremente seu direito de escolha, conforme os padrões aceitos nas democracias mais avançadas. Bem ou mal, temos um Judiciário independente e uma imprensa livre. Há problemas, e eles são muitos, mas nada que justifique tamanha insatisfação da maioria absoluta da população com o regime democrático, inédita na história desse levantamento do Ibope, feito desde 2008.
A explicação pode estar no fato de que os brasileiros em geral confundem democracia com prosperidade. Se o País vai bem, se há estabilidade, emprego e aumento da renda, cresce muito o nível de satisfação com a democracia. Foi o que se constatou no final do ano passado, quando ainda se vivia a fantasia criada pelos marqueteiros petistas a respeito do estado da economia.
Na ocasião, a pesquisa do Ibope indicou que 39% dos brasileiros se diziam satisfeitos com a democracia, o maior nível desde 2010. Estava claro que parte desse entusiasmo podia ser atribuído aos eleitores da presidente Dilma Rousseff, que havia sido reeleita fazendo uma campanha em que prometia mundos e fundos, uma continuação do logro lulopetista para iludir os mais pobres. Tanto que o maior porcentual de satisfeitos com a democracia estava no Nordeste (50%) e entre os que estudaram até o ensino fundamental (44%).
Em contraste, a pesquisa feita após as manifestações de 2013 indicou que apenas 26% estavam satisfeitos com a democracia. Eram tempos em que políticos e governantes em geral estavam sendo responsabilizados pela má qualidade dos serviços públicos - ou seja, nada a ver com a qualidade da democracia em si, mas com a incapacidade da classe política de inspirar confiança nos eleitores no que diz respeito à administração do Estado.
Agora, no entanto, encontramo-nos em outro patamar de desencanto com a democracia. Passam de 80% os brasileiros que se dizem pouco ou nada satisfeitos com esse regime. Como lembra José Roberto de Toledo, que divulgou a pesquisa em sua coluna no Estado, trata-se de um porcentual desconhecido mesmo em nações com imenso déficit de democracia na América Latina, como a Venezuela. No país governado pelo aprendiz de caudilho Nicolás Maduro, em que as eleições servem somente para legitimar o autoritarismo chavista, apenas 22% se dizem insatisfeitos com a democracia, segundo a mais recente pesquisa do Latinobarômetro (ver abaixo o editorial Desencanto generalizado). Na Bolívia, onde Evo Morales também tudo faz para se perpetuar no poder, os críticos da democracia são 10%.
A insatisfação dos brasileiros com a democracia é certamente um reflexo da imensa crise moral que se abateu sobre a classe dirigente, especialmente a partir do mau exemplo dado por aqueles que, quando estavam na oposição, diziam ser o antídoto para a corrupção e os desmandos, e que, quando chegaram ao poder, há uma década, estabeleceram um novo patamar de rapina.
Mas isso não explica tudo. Lula foi reeleito presidente no auge do escândalo do mensalão, e a petista Dilma Rousseff elegeu-se duas vezes mesmo depois que vários dirigentes de seu partido foram presos por corrupção. A questão, portanto, é outra: a decepção com os políticos, com a política e com a democracia aumenta quando se deteriora o cenário econômico e se constata que o governo e o Congresso não entregaram o que prometeram. A democracia tem sido vista pelo eleitor, portanto, como um meio para garantir ganhos pessoais; se os ganhos não aparecerem, culpe-se a democracia.
“É sinal de que os valores democráticos não estão arraigados”, disse Marcia Cavallari, do Ibope. O problema é claro: aceita-se a democracia como a melhor forma de governo, desde que os eleitos garantam emprego, renda e benefícios. Trata-se de uma forte vocação para o populismo.
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