segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Recessão empurra classe média para trabalho autônomo

• Modalidade já representa 20% da população ocupada e inclui mão de obra mais qualificada atrás de renda

Classe média reforça trabalho autônomo

• Brasileiros mais qualificados perdem vaga e buscam renda alternativa, mesmo com ganhos mensais menores

• Da população ocupada, 19,8% trabalham por conta própria, o maior patamar desde dezembro de 2006

Joana Cunha e Álvaro Fagundes – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Com o aumento das demissões (quase 1 milhão de vagas foram perdidas nos últimos 12 meses) e a dificuldade de conseguir um novo emprego com carteira assinada, o brasileiro está recorrendo cada vez mais ao trabalho por conta própria.

Em agosto, 19,8% da população ocupada se enquadrou nessa modalidade, o maior patamar desde dezembro de 2006, o equivalente a 4,5 milhões de trabalhadores. Um ano antes, essa participação era de 19%, e, em agosto de 2013, de 17,9%, segundo dados do IBGE das seis principais regiões metropolitanas.

Nos anos anteriores, o mercado de trabalho vivia um boom da carteira assinada, acompanhada de um avanço do rendimento do trabalhador, o que apoiou o período de crescimento da economia brasileira alavancado pelo consumo das famílias.

Esse cenário, com a recessão, acabou. "Estão acontecendo mudanças expressivas no mercado de trabalho. A forma de inserção está mudando", afirma Cimar Azeredo, coordenador de trabalho e rendimento do IBGE.

Essas mudanças se traduzem no funcionário da indústria de calçado que foi mandado embora e passou a consertar sapato em casa ou no engenheiro que também perdeu lugar e virou consultor.

Grande parte tem entre 25 e 49 anos, sustenta a família e não pode ficar parada em casa esperando uma nova oportunidade com carteira assinada. Ou seja, neste momento de crise, a renda é mais importante que benefícios como 13º salário e férias.

Muitos partem para atividades ligadas ao comércio, como a revenda de cosméticos ou alimentos, explica Azeredo, do IBGE.

Rendimento
Outra face deste novo modelo de inserção no trabalho aparece na renda.

Na média, o grupo dos que trabalham por conta própria tem sentido uma queda menor no rendimento real que os trabalhadores do setor privado com acesso aos direitos trabalhistas. Em agosto, os primeiros tiveram queda de 1,7%, metade da sentida pelos empregados com carteira assinada.

A explicação, porém, não é necessariamente positiva. Um dos possíveis motivos é a entrada de pessoas com maior qualificação, como advogados e engenheiros, no grupo do conta própria, que levantaram a média dos rendimentos –ainda que esses profissionais possam estar ganhando menos que quando eram empregados.

Naercio Menezes Filho, do Insper, ressalva que "ainda é cedo para verificar uma transformação radical no mercado de trabalho". Melhores conclusões a respeito dos reflexos da atual desocupação ficarão mais claros a partir do ano que vem, diz.

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