- O Estado de S. Paulo
A proposta de Orçamento da União para 2016 enviada ao Congresso contou ao Brasil o que já se sabia: o governo gastou mais do que deveria. A novidade é que as circunstâncias (pedaladas em processo de investigação, entre outras) não deixaram alternativas a não ser a confissão.
Louvável a rendição à transparência, não fosse pela prática habitual de expor a problemática sem se responsabilizar pela solucionática. O Executivo fez o que fez e agora, mais uma vez, empurrou para o Legislativo a tarefa de desfazer. Ou de amenizar o malfeito.
Foi assim no final do ano passado, quando o Parlamento escandalosamente concordou em alterar a meta do superávit primário para livrar a presidente Dilma Rousseff de punição em decorrência das maquiagens nas contas públicas por ela autorizadas e executadas pela equipe econômica.
Na ocasião, chegou a condicionar a aprovação da mudança ao pagamento de emendas parlamentares. A despeito de todos os protestos, suas excelências entregaram a encomenda, sob o argumento de que, uma vez consumado o mal, melhor limpar a cena do crime, a gastança desenfreada.
A ela se atribui culpa exclusiva de Dilma, mas nela o ex-presidente Luiz Inácio da Silva deixou impressas suas digitais. A origem de tudo está na concepção de Lula de que governar é gastar, improvisar e atuar com visão de curto alcance.
Isso quem disse foi ele em novembro de 2007, ao jornal O Globo, numa entrevista sobre o rumo do governo dali em diante. “A palavra de ordem deveria ser: pegou a bola fora da área, mete ela no gol. Chuta dez, uma entra”, dizia o chefe da Nação, defendendo a dinâmica da tentativa e erro em detrimento do planejamento.
Eufórico com a explosão do consumo - “um problema gostoso” -, o então presidente comemorava o endividamento dos brasileiros que, segundo ele, criava “uma população de dar inveja à China”. Questionado sobre os excessos no quesito gastos públicos, Lula orgulhava-se de ter “ousadia” para gastar: “Se fosse possível fazer a máquina funcionar diminuindo o dinheiro, seria ótimo.” Segundo ele, quanto mais gastasse, mais o Estado estaria sendo eficiente.
Apontava a gastança como salvação. Deu-se o oposto, contudo, abrindo-se o caminho para a perdição. Da população mais pobre, inclusive, aquele que, iludida, viria a garantir vitórias eleitorais ao seu partido e hoje pena nas garras da inflação.
Aquele Lula risonho e franco já ensaiava lançar como candidata à sucessão sua então ministra da Casa Civil, definida por ele como sua “sombra”, destinada a atuar como sua imagem e semelhança. Por mais que se buscassem marcar as diferenças de personalidade, na essência Dilma seguiu à risca a programação.
Até porque foi posta na condição de filial para não contestar os feitos da matriz. Seja no tocante à improvisação, ao imediatismo e à visão eleitoral do governo, seja no que tange a transações escusas que hoje se revelam.
A Lula agora interessa se mostrar descontente com Dilma, fiel ao hábito de dizer o que as pessoas querem ouvir. A dúvida pertinente é a seguinte: Dilma fosse diferente, tivesse ela cumprido outro roteiro, Lula estaria contente?
Dilma pode não saber por que foi escolhida pelo criador, mas ele sempre soube muito bem que sua motivação era a de controlar a criatura. Só não contava com a inépcia arrogante da escolhida, com a presteza das instituições naquilo que se pode considerar de fato uma “faxina” e com a esperteza do público, cuja capacidade de aceitar mistificações tem limite.
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