Quando se trata de inflação, o Brasil é uma anomalia. Se não chega perto de uma Venezuela, com taxas estimadas em 150% ao ano, fica muito distante de qualquer padrão atingido pela maioria dos países nas últimas décadas.
Enquanto os índices das nações mais ricas giram em torno de zero, o Brasil registrou, nos 12 meses encerrados em novembro, uma inflação de 10,5%, a maior desde 2003.
Impossível menoscabar o quanto isso revela sobre a caótica gestão da economia. Ao menos em tese, momentos de forte retração do consumo e desalento com o mercado de trabalho costumam se fazer acompanhar de queda dos preços –ou, no mínimo, redução da alta.
O governo da presidente Dilma Rousseff (PT), contudo, subverte essa teoria. Apesar da profunda recessão em que o país mergulhou, a taxa de inflação ainda sobe.
O repique dos preços neste ano era em grande parte esperado com o fim do controle artificial das tarifas públicas. Itens administrados subiram 17,9% no período. No caso mais notório, a conta de luz ficou 51,2% mais cara em 12 meses, resultado diretamente ligado à tosca intervenção do governo.
A desvalorização de 50% do real desde o ano passado também pesou, pois encarece os preços de importados e possibilita repasses nos produtos nacionais. Bens sujeitos à variação do câmbio (automóveis, eletrodomésticos etc.), por exemplo, subiram 7,96% no ano, outro recorde desde 2003.
Além disso, a escalada de preços se mantém no mesmo ritmo no setor de serviços, em torno de 8,5% ao ano. A persistência nesse segmento é especialmente preocupante, pois indica que a cultura da indexação permanece viva –e foi reforçada pelo fato de o Banco Central descumprir a meta de inflação por anos a fio.
Esses motivos tornam o quadro atual mais difícil que o de 2003, quando a inflação havia chegado a dois dígitos pela última vez. Naquele momento, tratava-se essencialmente de repasse cambial; o real tinha se desvalorizado pela incerteza da chegada do PT ao poder.
Hoje, a inflação elevada (e os juros nas alturas que a ela se acrescentam, outra excentricidade nacional) decorre sobretudo do deficit nas contas públicas, que reduz a confiança na manutenção do poder de compra da moeda nacional.
Tampouco houve evolução institucional para reduzir a indexação. Muitas concessões de serviços e infraestrutura mantêm cláusulas de repasse inflacionário automático, prática nem sempre alinhada à evolução real de seus custos.
Essa agenda precisa ser enfrentada quanto antes, pois a inflação solapa a previsibilidade das relações econômicas, constituindo grave ameaça a diversos avanços obtidos nas últimas décadas.
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