- O Globo
A judicialização do processo político está tão exacerbada que os partidos estão recorrendo ao Supremo Tribunal Federal até mesmo para conseguir vagas na comissão do impeachment. A ministra Cármen Lúcia já havia negado um pedido do deputado federal José Maria Macedo, do PSL, para garantir vaga para seu partido na comissão, e ontem o ministro Marco Aurélio recebeu outro desses, agora do Partido da Mulher Brasileira.
Também a disputa pelo comando do Conselho de Ética, que julga o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, por quebra do decoro, está sendo judicializada. O presidente da Câmara entrou no Supremo com uma petição se defendendo do que classifica de tentativas antidemocráticas de tirá-lo do cargo.
Agora, ele não se sente perseguido apenas pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que já foi procurado por diversos deputados pedindo sua ação para impedir que Cunha continue a se utilizar do cargo para intervir nas decisões do Conselho de Ética.
Ontem, o próprio presidente do conselho, deputado José Carlos Araújo — que vem sendo feito de bobo pelas manobras que os aliados de Cunha promovem para retardar o exame do caso —, decidiu aprovar um projeto afastando cautelarmente o presidente da Câmara, enquanto o processo sobre sua cassação tramitar na Casa.
Depois de ter sido ludibriado mais uma vez, com a decisão do vice-presidente da Mesa de acatar o pedido de impugnação do relator do Conselho de Ética, seu presidente já nomeou o substituto e tenta se livrar das ações protelatórias de Cunha e seu grupo.
Esse comportamento vergonhoso do presidente da Câmara está levando ao ridículo a própria Câmara, que não consegue ter um mínimo de respeitabilidade com a negligência do Conselho de Ética, que já adiou cinco vezes o julgamento da admissibilidade do processo contra Cunha.
Sua permanência à frente da Câmara também prejudica o processo de impeachment da presidente Dilma, e mais uma vez a judicialização de uma questão política, que tem a ver apenas com a Câmara e com o Senado, está tumultuando o andamento do processo. O ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fachin, que suspendeu todos os atos relativos ao impeachment, enquanto o plenário do STF não decidir questões levantadas pelo PCdoB, anunciou que está escrevendo um novo Código do Impeachment, o que é completamente inusitado.
Segundo o ministro Marco Aurélio Mello, “não podemos criar rito, porque nossa atuação não é normativa. O único ramo da Justiça que tem poder normativo é a Justiça do Trabalho. Nós no Supremo atuamos de forma limitada e temporariamente”.
O rito é o que está na lei, afirma o ministro do Supremo, referindo-se à lei do impeachment em cujo rito baseou-se o processo que retirou o ex-presidente Collor do poder, em 1992, e que agora está sendo usado pela Câmara. Se já existe uma lei em vigor, por que criar outra?
A disposição revelada pelo ministro Fachin, que vai além das questões levantadas pelo partido governista que impetrou a ação no Supremo, está preocupando até mesmo alguns de seus colegas. Fachin, no entanto, sinaliza que todos os atos até agora aprovados pela Câmara, até mesmo a formação da comissão pelo voto secreto, estão mantidos.
O que está em discussão é se a escolha dos membros da comissão deveria ter sido feita pelo voto secreto, e há juízes que não veem nessa questão um problema constitucional, mas, sim, uma escolha interna corporis que não pode ser resolvida por outro Poder.
Alguns juristas, no entanto, como o ex-presidente do STF Ayres Britto, consideram que o tema é tão delicado e importante para a democracia que não pode ser tratado como uma questão interna do Congresso. Para que não haja nenhuma dúvida com relação ao cumprimento das regras constitucionais, Ayres Britto defende que a escolha da comissão seja feita por voto aberto, até mesmo para evitar que as decisões sejam atribuídas a manobras do presidente da Câmara.
De qualquer maneira, não parece ser tarefa do Supremo Tribunal Federal definir as regras que a Câmara deve seguir nesse processo, que é definido por uma legislação que está em vigor desde 1950.
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