Correio Braziliense / Estado de Minas
O estrago que o velho hino está fazendo às
imagens de Lula e Alckmin não foi aferido, mas o meme faz a festa bolsonarista.
Nada mais simbólico para a falsa tese de que Lula e Alckmin são
comunistas
Quando o Partido Comunista Brasileiro (PCB)
foi fundado, em 25 de março de 1922, Astrojildo Pereira e seus oito
companheiros de origem anarquista não sabiam cantar A Internacional, como
registrou em seu poema Ferreira Gullar. Desde então, apenas os mais empedernidos
comunistas sabem a letra do hino composto em 18 de junho de 1888 por Pierre
Degeyter — um operário anarquista de origem belga, residente na cidade francesa
de Lille —, com base no poema do também anarquista Eugéne Pottier, operário
francês membro da Comuna de Paris.
O hino se tornou conhecido na França e se
espalhou pela Europa após o congresso do Partido Operário Francês, em 1896. A
ideia original de Pottier era fazer uma paródia da Marselhesa, o hino da
Revolução Francesa, mas Degeyter deu-lhe vida própria. C’est la lutte
finale./Groupons-nous et demain/L’Internationale/Sera le genre humain, o refrão
original, na tradução portuguesa ficou assim: “Bem unidos façamos, / Nesta luta
final, / Uma terra sem amos /A Internacional”.
A versão em russo serviu como hino da antiga União Soviética de 1917 a 1941, quando foi criado o hino soviético por Stalin, mas A Internacional continuou sendo o hino da maioria dos partidos comunistas. Entretanto, alguns partidos socialistas e social-democratas também haviam adotado o hino, antes do racha da II Internacional, por ocasião da Primeira Guerra Mundial. Hoje, são raros os que o mantêm.
O Partido Socialista Brasileiro (PSB) não
tem absolutamente nada a ver com essa história. A legenda foi refundada em 2 de
julho de 1985, por Antônio Houaiss (presidente), Marcelo Cerqueira, Roberto
Amaral, Evandro Lins e Silva, Jamil Haddad, Joel Silveira, Rubem Braga e
Evaristo de Moraes Filho, à frente de um grupo de estudantes e intelectuais.
Reivindicaram o legado da antiga Esquerda Democrática, que deu origem ao antigo
PSB, em 1947, sob liderança de João Mangabeira, Hermes Lima, Antônio Cândido,
Bruno de Mendonça Lima, Paulo Emílio Sales Gomes e José da Costa Pimenta.
Não se sabe de quem foi a ideia, mas em
todos os congressos recentes do PSB — que ganhou musculatura após a entrada de
Miguel Arraes, então governador de Pernambuco, em 1990 —, A Internacional é
executada com pompa e circunstância. Quase ninguém sabe cantar o hino. No
último congresso, não foi diferente, mas o contexto era inadequado, porque as
estrelas da abertura do evento, na quinta-feira passada, eram o ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-governador Geraldo Alckmin. O constrangimento
de ambos era visível, sobretudo do segundo, que trocou o PSDB pelo PSB. Alguns,
como Carlos Siqueira, presidente do PSB, cantaram o refrão com o punho direito
erguido, quando a tradição é usar o punho esquerdo.
Narrativas
O estrago que A Internacional está fazendo
nas redes sociais às imagens de Lula e Alckmin ainda não foi aferido, mas o
meme faz a festa de ativistas bolsonaristas, com ajuda de robôs, é claro. Nada
mais simbólico para corroborar a falsa tese de que Lula e Alckmin são
comunistas enrustidos. A grande massa de eleitores não sabe nem do ocorrido,
mas a extrema-direita tem o discurso na ponta da língua, ou do dedo, pois
estamos falando de redes sociais. O PSB deu farta munição para Lula e Alckmin
serem atacados pelos adversários, o que de resto já vinha acontecendo, em razão
da aliança com o PT. Fatos como esse, numa campanha eleitoral radicalizada,
alimentam a narrativa do bem contra o mal e da liberdade contra o comunismo,
adotada pelo presidente Bolsonaro.
E o 1º de Maio? Não é comemorado apenas no
Brasil. As manifestações ocorrem nas Américas, na Europa Ocidental, na Rússia,
na Índia, na China e em muitos países da África. A data foi escolhida em
homenagem aos trabalhadores dos Estados Unidos. Num sábado, 1º de maio de 1886,
cerca de 300 mil manifestantes foram às ruas em Nova York, Chicago, Detroit e
Milwaukee, entre outras cidades, para pedir a redução da carga horária máxima
de trabalho para oito horas por dia. Àquela época, se trabalhava até 16 horas,
seis dias na semana.
Em Chicago, os protestos duraram vários
dias e foram muito reprimidos, o que resultou na morte de quatro trabalhadores
e sete policiais, além de 130 pessoas feridas, em 4 de maio. Dos 2.500
manifestantes, 100 foram presos, sendo oito condenados à morte. Dois tiveram a
pena convertida em prisão perpétua, um apareceu morto na cela e os sindicalistas
Adolph Fischer, George Engel, Albert Parsons e August Spies foram enforcados.
Em 1893, o governador John Altgeld concedeu perdão aos sobreviventes.
As manifestações convocadas por Bolsonaro
para este domingo, portanto, não têm nada a ver com o 1º de Maio, data em que
as centrais sindicais fazem grandes festas e manifestações nas principais
cidades do país. São contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e têm jeito de
provocação golpista. Mais um sinal trocado na política brasileira.
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