O Globo
Mesmo que não soubesse da fraude, Lupi
demonstrou, no mínimo, completa incompetência para gerir um órgão essencial
como o INSS
As revelações ainda parciais de um esquema
antigo de desvio de recursos de benefícios de aposentados e pensionistas em
favor de entidades sindicais, consolidado e que vinha em franca expansão,
exigem ação mais firme por parte do governo. Trata-se de um escândalo da
categoria inadmissível, porque mexe naquilo que é mais vital na vida de pessoas
vulneráveis, justamente aquelas em nome de quem Lula prometeu ao longo da vida
toda governar.
Foi preciso que a Polícia Federal deflagrasse
uma operação para que o ministro da Previdência, Carlos Lupi, viesse a público.
E, ainda assim, sua primeira preocupação foi sair em defesa do agora
ex-presidente do INSS Alessandro Stefanutto, cuja permanência naquele momento
já era impraticável, e que cairia poucas horas depois.
A diferença de tom entre o responsável por gerir o INSS e seus colegas de ministério é um sinal cristalino de que Lupi não deu ao caso o sentido de gravidade que ele exige e de que não está apto a conduzir investigações internas e uma devassa no pagamento de benefícios que a fraude bilionária requer.
Enquanto o pedetista passava pano para seu
apadrinhado político e tergiversava sobre o escândalo, fazendo muxoxo porque o
caso corre em segredo de Justiça, os ministros da Justiça, Ricardo Lewandowski,
e da Controladoria-Geral da União, Vinícius Marques de Carvalho, deram
declarações na única direção possível: esse tipo de roubo em algo tão essencial
como aposentadorias e pensões é inadmissível, e o governo falhou em detectar o
esquema — aqui, pouco importa que ele tenha começado no governo anterior, porque
não só se manteve sob Lula, como ganhou mais tração e atingiu valores mais
expressivos.
O presidente tem de entender que não é
possível, nesse caso, segurar um ministro com o discurso-padrão do benefício da
dúvida ou da necessidade de esperar o avanço das investigações.
Lupi já está em sua segunda encarnação
ministerial. Não há nada nos seus feitos administrativos, aliás, que justifique
sua volta depois de ter sido demitido no governo Dilma Rousseff por causa de
denúncias envolvendo favorecimento a ONGs no Ministério do Trabalho, pasta que
ocupava na época. Apenas o fato de ser dono do PDT justifica sua nomeação para
a Previdência.
O próprio Lula já se queixou, ao longo de
dois anos e meio, das filas e da ineficiência do INSS. Não custa lembrar que
mais da metade deste mandato já foi, a hora de mostrar serviço passou, e
reduzir essa fila fez parte das promessas de campanha do petista, porque se
trata de algo que diz respeito a sua trajetória política: o discurso de defesa
do trabalhador e do aposentado.
Também não deveria ser preciso lembrar ao
presidente e a seus ministros mais próximos que qualquer esforço de recuperação
de popularidade será jogado no ralo caso esse escândalo ganhe proporções ainda
mais graves (e tudo indica que ganhará), uma vez que o estigma da corrupção é
marca indelével das gestões petistas para imensa parcela da população
brasileira, como atestam inúmeras pesquisas.
Não se trata nem de discutir se essa
percepção é correta, porque ela está sedimentada, e a única maneira de
debelá-la é com transparência e ação, como uma ala do próprio Executivo já
percebeu. Basta ver que o titular da CGU disse com todas as letras que não é
possível atestar se Lupi sabia dos descontos em benefícios feitos sem anuência
dos aposentados e pensionistas.
Aliás, não se trata nem disso: sabendo ou
não, o ministro demonstrou imensa incompetência em gerir um órgão vital para a
vida de milhões de pessoas, e isso contribuiu para uma fraude de mais de R$ 8
bilhões que o governo terá de dar um jeito de ressarcir aos que foram
covardemente lesados. Se isso não é motivo para trocar um gestor, o que mais
será?
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