Folha de S. Paulo
Governador dá cavalo de pau no discurso com
ares de moderação e vai de promessa de indulto a Moraes 'tirano' na Paulista
Quatro anos separam o Dia da Independência
mais radical do bolsonarismo deste domingo (7), quando Tarcísio de
Freitas (Republicanos) parece ter completado o checklist que o
grupo e os eleitores mais fiéis do ex-presidente lhe cobravam para chancelar
sua especulada candidatura presidencial.
Se no 7 de Setembro de 2021 Jair
Bolsonaro chamou Alexandre de Moraes de "canalha" e
disse que daquele momento em diante não cumpriria mais decisões do magistrado,
Tarcísio elegeu o mesmo alvo neste domingo.
O "ninguém aguenta mais a tirania de um ministro como o Moraes", frase dita após uma pausa de alguns segundos na sua fala, é o mais recente capítulo público da inflexão no discurso que se vendia como moderado e que começou a mudar em 29 de agosto.
Naquele dia, Tarcísio prometeu em entrevista
ao Diário do Grande ABC dar o indulto a Bolsonaro como primeiro ato de eventual
gestão sua como presidente da República. Mais ainda, cravou que infelizmente
não podia dizer que confia na Justiça.
Ato contínuo, o governador de São Paulo desembarcou
em Brasília para, ao lado do centrão, ressuscitar uma pauta que parecia
engavetada: a anistia não só aos condenados pelos ataques de 8 de janeiro de
2023, mas a Bolsonaro e a todos os réus da trama golpista do final de 2022.
De ideia natimorta defendida apenas
pelo PL,
a ampla anistia voltou a ser objeto de pressão em cima dos presidentes da
Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União
Brasil-AP) —e pode de fato ir a voto após o julgamento de
Bolsonaro, que será concluído nesta semana.
Para a plateia bolsonarista, Tarcísio e o
centrão defendem a mais irrestrita anistia, que incluiria a volta da
possibilidade de Bolsonaro se candidatar em 2026. Nos bastidores, porém, o
grupo de partidos que controla o Congresso aceita uma anistia criminal, mas não
a eleitoral, já que trabalha pela candidatura de Tarcísio. E o governador
trabalha pelo mesmo, afirmam.
Neste domingo, Tarcísio atendeu aos sonhos
dos mais empedernidos aliados do ex-presidente. O ataque direto a Moraes, do
alto do palanque símbolo para o grupo, exatos quatro anos após o
"canalha" do padrinho político, completou a inflexão no discurso.
É bom lembrar que, no início deste ano,
Tarcísio foi alvo da artilharia bolsonarista ao não ir à Paulista sob o
argumento de que passaria por um procedimento médico na tireoide. Um dos
principais críticos foi o mesmo pastor Silas Malafaia que neste domingo estava
ao seu lado.
A troca de mensagens entre Jair
Bolsonaro e seu filho Eduardo, reveladas pela investigação da
Polícia Federal, também mostrou como o governador de São Paulo era visto pelo
universo mais próximo ao ex-presidente.
"Tarcísio nunca te ajudou em nada
no STF.
Sempre esteve de braço cruzado vendo você se foder e se aquecendo para 2026
", escreveu
Eduardo ao pai.
A mensagem, porém, é de 17 de julho. Um mês e
20 dias depois, Tarcísio pode ser acusado de tudo, menos de não estar tentando
desfazer essa imagem junto ao bolsonarismo.
As movimentações do governador de São Paulo,
como quase tudo na política, guardam um relevante grau de imprevisibilidade,
mas é possível delinear alguns efeitos para os diferentes grupos políticos.
Integrantes do governo Lula dizem
ver Tarcísio candidato, com o ato na Paulista dizimando qualquer tipo de
dúvida.
O STF se inflamou, vide as
palavras do decano, Gilmar Mendes, que inclusive antecipou sua
opinião sobre o julgamento da trama golpista —embora não faça parte da Primeira
Turma, que julga o caso, pode se ver diante da necessidade de decidir sobre
eventuais recursos.
Já integrantes do centrão começam a dizer
que, após consolidada a candidatura, Tarcísio ficará mais livre para reatar
laços com o STF e pisar no freio em relação a movimentos considerados de
confronto.
Exatamente como há quatro anos, quando, após
intervenção do ex-presidente Michel Temer (que foi quem indicou Moraes ao STF),
Bolsonaro desdisse o que havia dito e descumpriu a promessa de não cumprir mais
as ordens do seu desafeto no tribunal.
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