A presidente Dilma Rousseff deixou claro anteontem, durante a primeira reunião ministerial de seu segundo mandato, que o ajuste ortodoxo em sua política econômica, ou as "medidas de caráter corretivo", não são um ensaio tentativo dos ministros da área e sim uma política de governo. Os motivos pelos quais há continuidade com mudanças, ou vice-versa, arrolados pela presidente, não passam pelo teste da lógica, mas para todos os efeitos práticos há consenso de que as contas públicas passarão por um aperto considerável e necessário, e que essa é uma base importante para que a inflação caia e a economia retome o crescimento. Para quem procurava definições: "Contas públicas em ordem são necessárias para o controle da inflação, o crescimento econômico e a garantia, de forma sustentada, do emprego e da renda", disse Dilma. "Nós vamos promover o reequilíbrio fiscal de forma gradual".
Há várias maneiras de julgar a solidez, a consistência ou as intenções do ajuste ortodoxo em curso. É pura perda de tempo imaginar que Dilma fará autocrítica da política anterior nos termos que dela esperam a oposição liberal e parte do mercado financeiro - isso simplesmente não vai ocorrer. Também não é produtivo crer que, na ausência de diagnóstico explícito do que não deu certo, uma "nova matriz econômica" rediviva voltará a assombrar a economia. O PT voltou a ser pragmático diante da alternativa de perder o poder, como quase ocorreu na eleição passada.
Além disso, é pueril ficar esperando por sinais claros de que Joaquim Levy, ministro da Fazenda, terá autonomia para executar suas ideias. Pode-se imaginar e desejar que o Banco Central tenha autonomia e isso faz sentido. Mas não se conhece ministro da Fazenda autônomo - ele é o executor de uma política de governo. Por último, Levy é o primeiro titular da Fazenda em governos petistas que não é do partido. Supor que terá "carta branca" para agir é insensato.
Em seu discurso, a presidente deu linhas gerais do que pretende fazer e do que não quer mudar. Além de ratificar o que já foi anunciado - meta de 1,2% do PIB para o superávit primário, cortes no Orçamento e aumento de impostos - ela acenou com uma auspiciosa generalização e ampliação das concessões em seu segundo mandato.
Esse é um ponto importante para a vital aceleração da modernização da infraestrutura e uma lição de realismo. Dificilmente os investimentos escaparão da tesoura no Orçamento, já que despesas discricionárias passivas de cortes não são enormes. Depois, pode-se estar diante da reversão da prática excessivamente intervencionista do primeiro mandato, cujo resultado mais evidente foi a queda dos investimentos.
Por outro lado, a presidente não parece disposta a rever nada a respeito da Petrobras e de seu papel. Apesar de atacar a corrupção e prometer encaminhar ao Congresso projetos que acelerem processos e aumentem punições, Dilma ainda vê uma conspiração oculta contra a estatal, externa a ela e que envolveria, algo sumamente curioso, as empreiteiras imersas no escândalo. "Toda vez que tentaram, no Brasil, desprestigiar o capital nacional estavam tentando, na verdade, diminuir a sua independência, diminuir a sua concorrência e nós não podemos deixar que isso ocorra", disse.
Pelo menos até agora, por mais visível que se torne o descompasso entre a capacidade financeira da Petrobras e as atribuições que lhe foram concedidas no pré-sal, ou entre sua capacidade de financiamento e a enorme dívida que já carrega consigo, a presidente não vê motivos para mudanças. Em suas palavras, é necessário apostar no modelo de partilha e na continuidade da "vitoriosa política de conteúdo local". O escândalo na Petrobras pode atingir de morte várias das empresas envolvidas na produção local de equipamentos e o programa necessita claramente de revisão.
As demais ações mencionadas por Dilma na reunião dependem ora do resultado da limpeza fiscal, ora da capacidade gerencial do governo - pelo passado, nada invejável - ou de sua força política. Um plano de desburocratização em uma administração com 39 ministérios não deve ir muito longe. Um Plano Nacional de Exportações é bem-vindo, mas até agora, em 12 anos de governos petistas, ações isoladas tiveram contra si a valorização do real. Aumento da taxação de importados, ademais, não é um ponto de partida auspicioso para quem pretenda incentivar as vendas externas. Ao contrário, é preciso abrir mais a economia.
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