A situação crítica das contas estaduais não pode servir de pretexto para que governadores condicionem seu apoio à reforma da Previdência a alguma forma de socorro da União para os Estados. Como lembrou Paulo Hartung, ex-governador do Espírito Santo, em entrevista ao Estado, “a reforma é importante para o governo federal, para os Estados e para os municípios”, ou seja, “é importante para o País”, razão pela qual “não faz sentido nenhuma ação de toma lá dá cá”.
Com isso, o ex-governador Hartung quis dizer que a reforma da Previdência não é uma escolha, e sim uma imposição dos fatos, e, portanto, não pode ser objeto de barganha - pela simples razão de que uma eventual rejeição do projeto seria catastrófica não apenas para o governo federal, mas para todos os entes federativos e para o conjunto dos cidadãos.
Já a aprovação da reforma, como enfatizou o ex-governador capixaba, será benéfica para todos. “É o tipo da ação ganha-ganha”, disse Paulo Hartung. Isso significa que os governadores deveriam se empenhar em arregimentar votos a favor do projeto encaminhado pelo governo mesmo que não haja neste momento ou mesmo no futuro alguma oferta de ajuda para Estados que estão em situação pré-falimentar.
Ademais, uma barganha como essa só faria algum sentido se os governadores tivessem mesmo grande capacidade política de convencer as ditas bancadas estaduais a votarem conforme sua orientação, ou se eles realmente se mostrassem empenhados em favor da reforma. Não se verifica no momento nem uma coisa nem outra.
Recorde-se que nos últimos anos os Estados receberam substancial ajuda do governo federal, mas os governadores pouco participaram do esforço de aprovação da reforma da Previdência. Paulo Hartung comentou que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que está na linha de frente da mobilização dos governadores pela reforma, parece convencido de que “qualquer apoio aos governos estaduais deve ser realizado depois da aprovação da reforma”. Como disse o ex-governador capixaba, trata-se de um grande avanço em relação ao que se fazia no passado, quando a promessa desse apoio era sujeita ao atendimento das reivindicações dos governadores.
Por fim, mas não menos importante, é preciso questionar a pertinência de um novo pacote de socorro federal aos Estados, no momento em que o esforço para tirar o País da crise tem de ser coletivo. Os governadores vêm contando há bastante tempo com a compreensão da União para ganhar algum fôlego financeiro, suficiente para honrar a folha de pagamento e os fornecedores. A cada presidente que se sucede, novas negociações são entabuladas e novos pacotes de ajuda são costurados. O fato, como disse o ex-governador Paulo Hartung, é que muitos Estados acreditam que Brasília seja uma espécie de “porta da esperança”, cuja abertura revelaria a solução imediata e mágica de todos os problemas. Em pouco tempo, contudo, o socorro se torna insuficiente, pois os elementos que estão na base da crise - especialmente os que dizem respeito ao gasto excessivo com pessoal e com inativos - permanecem intactos.
É possível, no entanto, enfrentar a crise de outra maneira, reduzindo a despesa corrente dos Estados. Esse é o caminho politicamente mais difícil, pois é necessário tomar medidas de austeridade fiscal e enfrentar as corporações de funcionários públicos, e talvez por isso mesmo os governadores sejam tão reticentes a trilhá-lo. Mas é a única forma de sanear as contas e acabar com a dependência sistemática de auxílio federal.
Assim, faz todo o sentido que o governo espere a aprovação da reforma da Previdência para só então discutir com os governadores alguma forma de socorro, condicionada à capacidade real do Tesouro - isto é, sem a costumeira demagogia - e com o real compromisso dos Estados de melhorar suas contas.
Com a reforma da Previdência, todo esse processo de saneamento deverá ser facilitado, já que o rombo previdenciário é hoje o grande fator de desequilíbrio fiscal da União e dos Estados. Por essa razão, os governadores deveriam ser os primeiros a apoiar a reforma, pois sem ela não haverá socorro que chegue.
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