- O Estado de S.Paulo
Bolsonaro reforça liderança, recebe jornalistas e admite negociar reforma, mas...
Aos poucos, mas claramente, o presidente Jair Bolsonaro vai entendendo algumas premissas básicas do cargo, mas é aos poucos mesmo. Ele reluta, reclama de conselhos, ameaça não mudar nada e vai cedendo, mas mantendo a teimosia, ou uma implicância desnecessária e seletiva que não ajuda em nada.
Depois de nomear um líder inexpressivo na Câmara, Major Vitor Hugo, e um neoaliado no Senado, Fernando Bezerra, Bolsonaro, enfim, acertou com a líder do governo no Congresso. A deputada Joice Hasselmann (PSL-SP) é neófita no Parlamento, meio estabanada, mas tem algo que falta aos outros dois: liderança, personalidade, acesso direto ao Planalto. Dizem que chama o presidente de “Jair”.
É capaz, até, de fazer o que nenhum outro integrante da base aliada ao Planalto faz: bater de frente com o 03, o deputado Eduardo Bolsonaro. Vivem aos tapas e beijos, mas não rompem e estão ambos empenhados em ajudar Bolsonaro, o governo e a aprovação da “Nova Previdência” – apesar de declarações antigas dele contra a reforma. Mas o pai também era contra. Isso é passado. Poder é poder.
Ontem, Joice Hasselmann já teve de apagar um início de incêndio, depois que Bolsonaro admitiu ceder em pontos da reforma, como a idade mínima para mulheres (de 62 para 60 anos) e as mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC). O mercado reagiu mal e o pior foi o susto da área econômica.
Na quarta, Joice se reuniu com Paulo Guedes, Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre. Ontem, já estava desde cedo com o chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni. E coube a ela lembrar que, se tirar receita de um lado, vai ter de compensar de outro. Qual? O fato é que a conta de Guedes, de mais de R$ 1 trilhão, tem de fechar.
Outra questão é como vai se materializar o pragmatismo da nova líder para negociar com o Congresso: vem aí distribuição de cargos de segundo e terceiro escalões? Liberação de emendas parlamentares? Projetos camaradas para a base aliada?
Caindo na real, após dois meses de mandato, Bolsonaro também começou a perceber que é bacana, e pode até ser divertido, governar com os filhos via redes sociais, mas isso não é tudo e pode ser perigoso. Redes sociais que aplaudem também apedrejam.
Assim, Bolsonaro inaugurou ontem algo comum em qualquer governo: conversas com jornalistas. É quando os presidentes abrem o coração, explicam suas decisões, projetam os próximos passos para os responsáveis pela cobertura e pela análise política. Olho no olho, tornam-se personagens de carne e osso, com seus defeitos e qualidades.
É inexplicável que tenha deixado de fora jornalistas do Estado, da Folha e do jornal O Globo. Isso lembra Lula, que começou discriminando um jornalista daqui, outro dali, e, no fim, metia no Planalto ou no Alvorada até os tais “blogs sujos”, braços armados do PT na internet. Com Dilma, era pior. Assim como desdenhava a política, ela desdenhava o jornalismo.
Bolsonaro não disse que faria tudo diferente? Deveria começar com o tratamento igual da mídia, lembrando que há repórteres que passam dias inteiros no Planalto, cobrem os presidentes e os ministros do núcleo duro do poder e devem ser respeitados, levados em consideração e bem informados. Além de precisar de notícias, eles precisam entender a notícia.
Todo governo tem dificuldades no começo, mas Bolsonaro, como diz FHC, está exagerando. Até quando acerta, dá um jeito de atrapalhar o acerto. Os filhos e os ministros da Educação, das Relações Exteriores, dos Direitos Humanos e do Meio Ambiente também não ajudam e pegou mal Sérgio Moro desconvidar a prestigiada cientista política Ilona Szabó para um conselho da Justiça. O governo tem muito a melhorar.
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