quinta-feira, 25 de março de 2021

Maria Hermínia Tavares* - O governo perdendo gás a olhos vistos

- Folha de S. Paulo

Manifesto de economistas e empresários é vitória da demanda por sensatez sobre a demanda por mágica

carta aberta de economistas, banqueiros e empresários cobrando medidas de combate à pandemia é importante por mais de um motivo.

Primeiro, por suas propostas tão simples quanto urgentes: acelerar o ritmo da vacinação; incentivar o uso de máscaras; implementar medidas de distanciamento social de acordo com necessidades e possibilidades definidas em nível local; criar mecanismos de coordenação de âmbito nacional; e manter medidas de apoio à população mais vulnerável e às pequenas e médias empresas enquanto durar a emergência.

Depois, porque suas quatro parcimoniosas recomendações foram capazes de juntar pessoas com opiniões heterogêneas quanto ao melhor rumo para a economia. Uma vitória da demanda por sensatez sobre a demanda por mágica, nas palavras do economista Gustavo Franco, um dos mais de 1.500 subscritores do documento, em questão de dias.

Por fim —e mais importante— pela sinalização política que parece dar. Para além das diferenças de visão da economia e da política, certamente existentes em um grupo tão numeroso, parte dele é formado por pessoas que apoiaram o impeachment de Dilma Rousseff e que, em 2018, por aversão ao PT, ou votaram no candidato da extrema direita, ou se abstiveram, facilitando sua chegada ao Planalto. Que venham a público registrar o desatino de sua atitude diante da pandemia é sintoma do isolamento político crescente daquele cujo nome é melhor omitir.

O mesmo parecem dizer as pesquisas com quem frequenta assiduamente as redes sociais e o público em geral. Levantamento da empresa Arquimedes mostra que, no mundo digital, as atitudes do ex-capitão diante da pandemia tem hoje o apoio apenas dos seus minions. Liberais e defensores da Lava Jato, que já estiveram mais animados com o governo, hoje falam um idioma aparentado ao dos opositores: responsabilizam o inominável pelo desastre sanitário e a crise econômica.

Finalmente, as mais recentes sondagens produzidas por diferentes institutos convergem ao mostrar que, depois de ter obtido 46% dos votos válidos no primeiro turno e 55,3% no segundo, o ocupante do Planalto conta agora com cerca de 30% dos brasileiros que consideram bom ou ótimo seu desempenho.

Em outros termos, lideranças do mundo das ideias e dos negócios, ativistas digitais e cidadãos comuns se distanciam daquele que há pouco mais de dois anos foi tido como alternativa aceitável à permanência do PT no governo. Sem esses apoios contingentes, a extrema direita não passa de minoria --ainda perigosa, mas perdendo gás a olhos vistos e longe de ser imbatível nas urnas.

*Maria Hermínia Tavares, professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap. 

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