Folha de S. Paulo
Se os parlamentares se recusam a dar
transparência às emendas é porque há algo de podre a esconder
Impressiona, embora não surpreenda, a
relutância dos parlamentares em atender ao quesito de transparência do artigo
37 da Constituição
escrita pelo Congresso ao qual pertencem.
A recusa de fazer jus à Carta de 1988 já
ficou patente em 2022 quando a então ministra Rosa
Weber, do Supremo Tribunal Federal, confirmou a ilegalidade do chamado
orçamento secreto e o Parlamento simplesmente ignorou a sentença.
Dois anos depois, Flávio Dino assumiu a cadeira dela, decidiu dar um fim ao desrespeito e pegou o touro na unha. Tentou por bem, chamando ao STF representantes do Legislativo e do Executivo para um acordo mediante o qual o uso das emendas seria rastreável e com identificação de autoria.
Não adiantou. Na época presidente
da Câmara, Arthur Lira (PP) saiu do encontro dando sinais evidentes de
que não adiantaria mesmo. E assim foi, com manobras de aparência que mal
disfarçavam a tentativa de burlar não o STF, mas a legalidade.
Aí, com respaldo o colegiado, Flávio
Dino tentou por mal e suspendeu a liberação dos recursos. Como o fez
em período eleitoral em que as emendas não poderiam mesmo ser pagas, os
congressistas não deram muita bola, voltando à carga com o término do pleito.
Foi usada a mais poderosa e perversa arma de
pressão: o Orçamento da União, travado até hoje com votação atrelada à
liberação total do dinheiro.
Numa demonstração de boa vontade ao Congresso
e atenção ao Executivo, o ministro Dino aceitou um plano de trabalho em forma
de resolução legislativa que acaba de ser aprovada com o quê? Mais um truque de
escape.
Bancadas partidárias e comissões podem
apresentar emendas sem identificação de autoria. Às favas, portanto, com a
transparência e a obediência à lei.
Se deputados e senadores resistem tanto à
divulgação plena dos dados de um instrumento, como dizem, benéfico à população
e, portanto, passíveis de render dividendos eleitorais, é porque algo de podre
há a esconder. Como de resto indicam as dezenas de investigações sobre desvios
em curso no Supremo.
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