- Valor Econômico
Reformista, Temer tenta salvar reforma da Previdência
A forte mobilização de sindicatos de professores, juízes e promotores nos Estados está por trás da turbulência que ameaça o avanço da reforma da Previdência no Congresso Nacional. Além de espalhar informações nem sempre verídicas sobre as contas da Previdência, usando de todos os meios possíveis, as entidades foram competentes em constranger deputados federais, que, temerosos com a possível perda de apoio político em suas bases, começaram a informar aos líderes que seria difícil votar favoravelmente na proposta do governo.
Durante reunião com o presidente Michel Temer na semana passada, os líderes explicaram a resistência do funcionalismo e seus efeitos sobre as bancadas federais. Praticamente na mesma hora, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, estava reunido com a bancada do PSDB na Câmara dos Deputados, ouvindo queixas contra regras "draconianas" da proposta enviada ao Congresso.
Naquele momento, a cúpula do governo percebeu que a reforma corria perigo. Se nem o PSDB parece estar disposto a votar mudanças no regime previdenciário do país...
O que ficou claro para o Palácio do Planalto é que os governadores, mesmo encalacrados com as finanças de seus Estados, não se mostravam dispostos a atuar junto às bancadas para fazer o contra-lobby dos sindicatos. Mesmo a única exceção - o governador do Estado do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão (PMDB) - não mostrou eficácia nas ações de bastidor.
Temer decidiu, então, excluir da reforma os funcionários públicos dos Estados e municípios. A notícia não teve boa repercussão porque mostrou o governo cedendo onde não pode neste momento emergencial da vida nacional - no ajuste das contas públicas. Ademais, a exclusão atenta contra dois artigos da Constituição. Portanto, para a diferenciação dos regimes vigorar, seria necessário mudar o texto constitucional.
Outras repercussões viriam. Juízes e procuradores federais, além de professores e outras categorias do setor público, exigiriam equiparação à situação de seus colegas nos Estados e municípios. Não se ponha em dúvida a força das corporações do serviço público no Brasil. Para muitos funcionários, o Estado não é a representação da sociedade politicamente organizada; o Estado são eles, funcionários. É algo que pertence a eles. Assim como em muitas estatais os empregados se consideram "donos" das empresas.
Na prática, Temer tomou a decisão de excluir da reforma o funcionalismo dos entes subnacionais porque imaginava que, ao fazer isso, os governadores correriam a Brasília para, nos bastidores e longe dos holofotes, pedir a reinclusão. Isso não ocorreu. Os governadores ficaram quietos em seu canto. Restou ao governo emitir um sinal de fraqueza à sociedade.
No sábado, acompanhado do secretário de Previdência Social, Marcelo Caetano, o ministro Henrique Meirelles almoçou com o presidente Temer em Brasília. Era preciso encontrar uma saída para o impasse criado nos Estados. Evidentemente, a equipe econômica não gostou da exclusão dos funcionários estaduais e municipais. A solução, então, foi dispor na proposta em discussão no Congresso que, preservada a autonomia federativa, os Estados terão prazo de seis meses para aprovar reformas em seus regimes previdenciários e obedecer às normas gerais que passarão a vigorar na Constituição. Se nada for feito nesse prazo, os Estados terão que seguir as regras federais em sua integralidade.
Temer sabe que, dificilmente, os governadores aprovarão a reforma das previdências estaduais. Além disso, do jeito que ficou, não tem como fugir: quem apresentar projeto de reforma às assembleias legislativas terá que assumir o ônus político da iniciativa. É provável, por essa razão, que poucos governadores - ou nenhum - queiram incorrer nesse risco.
Os Estados que decidirem criar o próprio regime previdenciário terão que respeitar algumas "diretrizes gerais", informa um auxiliar do presidente Temer. Uma dessas diretrizes é a fixação da idade mínima de 65 anos para aposentadoria. Critérios de eligibilidade, em geral, terão que ser comuns a todos os regimes. "Isso não pode ficar solto porque, senão, anula os efeitos da reforma", explicou essa fonte.
Um possível fracasso da reforma da Previdência seria desastroso para o país e, obviamente, para o governo Temer. Há apenas dez meses no cargo, sendo que há somente sete meses efetivo, Temer teve a coragem de bancar uma agenda de reformas e mudanças considerada impopular. Sem capital político próprio, mas podendo justificar a dureza das medidas adotadas à situação crítica em que encontrou o país, principalmente, as contas públicas, o presidente montou um governo "congressual". Seus ministros, em geral, não são notáveis em suas áreas de atuação, mas têm votos para aprovar medidas difíceis no Congresso.
Em sete meses, o governo aprovou a extensão da DRU, mecanismo que desvincula em favor da União parte das receitas federais; um padrão de governança para toda e qualquer estatal, e não apenas para as federais, uma boa resposta ao mega-escândalo de desvio de recursos da Petrobras; mudanças no marco regulatório do petróleo, liberando a Petrobras de estar presente, com 30% do capital, em todos os consórcios que disputam campos do pré-sal; um novo disciplinamento para as regras de exigência de conteúdo local em obras de infraestrutura e investimentos no setor de petróleo; e a fixação de um teto, por 20 anos, para as despesas federais, estancando o crescimento real (acima da inflação) dos gastos. Além disso, encaminhou ao Congresso propostas de reforma trabalhista e tributária, medidas necessárias à melhoria do ambiente de negócios e ao aumento da produtividade da economia.
Um ministro próximo a Temer argumenta que não foi errada a estratégia de aprovar o teto de despesa antes da reforma da Previdência. Em tese, mais longe da eleição de 2018 seria mais fácil passar a mais impopular das reformas. Ademais, será difícil respeitar o teto a partir de 2018 se a reforma não for aprovada. "À medida que se aprovou o teto, alinhamos os interesses com os parlamentares. Dissemos 'se não aprovar o teto, vamos ter que cortar tais e tais despesas'. Nessa hora, deputados e senadores entenderam e o teto passou", justificou uma fonte.
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