Bolsonaro quer apoio para pressionar governos estaduais
Jair
Bolsonaro sentiu o baque. Anda reclamando da vida até mesmo em eventos públicos
e conversas informais com os apoiadores que fazem plantão em frente ao Palácio
da Alvorada.
O
presidente tinha confiança no peso do seu voto e achou que poderia fazer uma entrada
triunfal no fim da campanha. Fracassou. Elegeu poucos aliados e agora terá que
observar, pacientemente, adversários questionarem seu prestígio político. No
entanto, neste momento preocupa-o, sobretudo, como os prefeitos eleitos
enfrentarão a pandemia a partir de 2021. Desenha-se a tentativa do presidente
de construir uma frente municipalista formada por prefeitos dispostos a
promover a reabertura das atividades econômicas, a despeito de eventuais
orientações partidárias ou determinações dos governadores.
Esta
é uma questão crucial para o governo federal. Pouco se sabe o que o ministro da
Saúde pensa a respeito, mas na equipe econômica já se fala de imunidade de
rebanho. No Planalto, teme-se que uma segunda onda de covid-19 leve os entes
subnacionais a adotarem novas medidas de isolamento social, o que atrapalharia
a retomada da atividade econômica.
Também
por isso o presidente ignorou a recomendação de alguns auxiliares e acabou
decidindo ampliar a campanha para além do seu grupo político mais próximo. Mal
sabia o número ou a legenda daqueles que estava promovendo. Insistia, por outro
lado, que os eleitores escolhessem quem estivesse disposto a pressionar os
governadores contra a adoção de novas medidas de isolamento social.
O
governo tem um mapeamento de quais foram as políticas de contenção dos Estados.
Acompanha as consequências dessas medidas em relação à evolução da pandemia e
aos seus efeitos na economia. Monitora os setores mais prejudicados em algumas
das unidades da federação, como o de serviços em São Paulo ou no Rio Grande do
Sul.
Isso
começou a ser feito logo depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) assegurou
a autonomia de Estados e municípios para a implementação de ações voltadas a
impedir a propagação do coronavírus.
Desde
o primeiro momento, Bolsonaro preferiu se posicionar contra as políticas de
restrição social e virar uma voz crítica aos governadores que pensavam de forma
diferente. Sem um exemplo vindo de Brasília, cada Estado agiu de uma forma,
diante de suas especificidades e das informações disponíveis.
Não
houve uma padronização. Algumas unidades da federação deixaram poucas
alternativas aos municípios e determinaram de forma rigorosa as ações a serem
executadas em seus territórios. Isso ocorreu, em alguns casos, porque os
prefeitos hesitavam em reagir à moléstia que se espalhava com rapidez pelo
país. A maior preocupação era o risco de colapso do sistema de saúde. Na visão
do poder central, agiram dessa forma Goiás, Pará e Santa Catarina - neste
último caso, apenas num primeiro momento.
Outros
Estados preferiram políticas articuladoras, como Ceará, Pernambuco ou São
Paulo, ainda de acordo com autoridades federais. Essa estratégia buscou
encorajar o diálogo entre órgãos públicos estaduais, municipais e entre
prefeitos de cidades vizinhas. A ideia era compartilhar responsabilidades e,
claro, eventuais ônus políticos.
Um
grupo de governadores preferiu delegar às prefeituras o poder de decisão. Outro
optou por dar liberdade de ação aos prefeitos, desde que as políticas adotadas
não fossem rigorosas demais ou impeditivas. Em diversos casos, as posturas de
Estados e municípios evoluíram ou foram sendo calibradas ao longo dos últimos
meses, dependendo do achatamento ou não da curva de mortes e infecções.
A
leitura de uma recente pesquisa da Confederação Nacional dos Municípios também
pode explicar por que o presidente está tão decidido a impedir novas
iniciativas de controle e prevenção, mesmo que a equipe econômica não trabalhe
com a possibilidade de uma segunda onda.
Segundo
o levantamento da CNM, 96,5% das prefeituras aplicaram medidas restritivas para
a diminuição da circulação de munícipes ou de aglomerações. Outros números
também chamam atenção: 52,4% adotaram barreiras sanitárias, com posto de
monitoramento de entrada e saída de pessoas no município; 75,7% estabeleceram
isolamento social com a permissão de abertura e funcionamento apenas dos
serviços essenciais; 94,2% publicaram normas para uso obrigatório de máscaras;
e 54,4% reduziram oferta de transporte público.
Por
outro lado, o documento traz um relativo alento para o presidente, pois 61,9%
dos executivos locais reconheceram que houve flexibilização durante o período
da pesquisa. O levantamento foi realizado entre março e agosto.
No
último fim de semana, contudo, a democracia deu mais uma lição a Bolsonaro.
Fazer política é um processo que demanda mais do que uma conexão de internet e
um horário na agenda depois do expediente para transmissões ao vivo nas redes
sociais. Exige conversa e a valorização dos partidos políticos, além do
respeito às instituições.
Mesmo
assim, novamente o presidente demonstra a intenção de arregimentar um grupo
suprapartidário em torno de suas ideias. No início do governo, ele achou que conseguiria
negociar com o Congresso por meio das frentes parlamentares temáticas e foi
obrigado a aproximar-se dos políticos tradicionais que tanto desprezava. Agora,
acena aos gestores locais com programas federais e uma possível ajuda na
implementação de iniciativas potencialmente populares, como a estruturação de
escolas cívico-militares.
Os prefeitos tomarão posse em janeiro já pedindo mais apoio financeiro, diante da perspectiva de que não se repetirá o grande volume de transferências de recursos observado durante este ano. Será uma nova oportunidade para o presidente defender o fim do isolamento social e movimentar a máquina em direção à campanha de 2022.
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