Tucano critica presidente do partido e Rodrigo Garcia e diz que 'perder unido nesta hora é uma grande coisa'
Julia Chaib / Folha de
S. Paulo
BRASÍLIA
- Um
dos principais nomes do PSDB, o deputado Aécio Neves (MG) tece duras
críticas à conduta do presidente do partido, o ex-deputado Bruno Araújo (PE),
no processo de construção da candidatura tucana ao Palácio do Planalto.
O parlamentar acusa Araújo de tirar protagonismo da
sigla e argumenta que ele trabalha para que João Doria (SP), vencedor das prévias na
legenda, não seja candidato à Presidência. Para Aécio, Araújo atua mais como
"advogado" do governador de São Paulo, Rodrigo Garcia, que busca a
reeleição, do que como líder nacional do PSDB.
O caminho para rifar Doria seria um acerto pelo qual o PSDB apoiaria a candidatura de
Simone Tebet (MDB-MS) à Presidência. Aécio refuta esse acordo.
"O Doria sempre foi o bode que precisava ser
retirado da sala para viabilizar a candidatura de Rodrigo Garcia", afirma
Aécio em entrevista à Folha.
O deputado defende que o PSDB tenha candidatura
própria, mesmo que sem perspectivas de vitória; e avalia que o ex-governador gaúcho Eduardo Leite (PSDB) teria sido o melhor
nome para liderar a terceira via no país.
O PSDB hoje está repleto de divergências internas.
Qual deve ser o caminho do PSDB, na sua avaliação?
Tudo que estamos vivendo hoje é consequência de
equívocos que foram cometidos. A terceira via implodiu pelo pragmatismo de uns
e pelo egoísmo do PSDB. Você não pode cobrar que um partido como o União
Brasil, recém-fundado, lidere um projeto nacional. No futuro, talvez sim, mas
hoje ele tem duas prioridades: recuperar a sua bancada para voltar a irrigar o
duto dos financiamentos eleitorais e eleger governadores.
O MDB, por outro lado, é um partido que tem uma
história gloriosa, mas está em busca de uma reconciliação com seu passado.
Ainda mais depois de dez anos de sociedade com o desgoverno do PT.
Mas o PSDB não. Aí é que entra a minha crítica ao
que ocorreu até aqui.
Qual é a crítica?
O PSDB não se colocou à altura do papel que deveria
estar desempenhando. O próprio presidente [do partido,] Bruno Araújo, optou por
ser muito mais advogado dos interesses da candidatura de Rodrigo Garcia [para o
Governo de São Paulo] do que presidente nacional do PSDB, um partido que
poderia estar liderando a terceira via.
Diferentemente do União Brasil e do MDB, nós tivemos
a oportunidade para isso. Nós tivemos a candidatura do Eduardo [Leite
(PSDB-RS)], que poderia estar adiante [nas pesquisas].
Mas desde o início o objetivo foi criar as condições
para que João Doria saísse do Governo de São Paulo e permitisse ao Rodrigo
Garcia construir a sua candidatura. Não tenho nada contra [Garcia], a
candidatura dele é bem-vinda, mas não ao custo da inviabilização do PSDB.
O Doria sempre foi o bode que precisava ser retirado da sala para viabilizar a candidatura do Rodrigo Garcia. Por isso que as prévias foram feitas completamente fora do tempo, sem que houvesse outra candidatura. O Leite só surge como candidato quatro meses depois de anunciadas as prévias.
O nome do Doria foi escolhido nas prévias em
novembro, mas desde então o sr. trabalhou por Leite. Foi inclusive acusado de
golpe pelos seus pares. Por que o senhor não legitimou as prévias?
Isso beira o ridículo. O golpe houve quando tentaram
fraudar as prévias, incluindo eleitores não habilitados com base em recursos
públicos.
Estabeleceu-se um verdadeiro mercado persa no PSDB
para cooptar companheiros nossos, que acabaram dando vitória ao Doria. E muitos
desses compromissos foram respaldados pelo Governo de São Paulo e pelo [então]
vice-governador Rodrigo Garcia.
Tudo para tirar o Doria do incômodo lugar de
governador de São Paulo. E no momento em que Doria teve um átimo de lucidez e
resolveu permanecer no governo, ele foi ejetado da cadeira.
Agora, [é ruim] retirarmos uma candidatura para
apoiar o MDB única e exclusivamente para justificar a saída do Doria; um
partido que jamais cogitou apoiar uma candidatura do PSDB.
Eu nunca quis a candidatura do Doria, acho que será
um momento trágico para o PSDB. Mas ele ganhou as prévias, não ganhou?
Maculadas, tínhamos um candidato que podia estar hoje lá na frente, com outros
apoios. O PSDB ignorou isso.
Quando o sr. decidiu tentar viabilizar a candidatura
de Leite...
Eu já estava identificando o que está acontecendo
hoje. O Doria nunca foi candidato.
Eu quero que deixar clara a minha solidariedade ao
Doria porque uma coisa é você enfrentar um adversário de frente e dizer que ele
não era a pessoa adequada para liderar o PSDB. Mas agora se busca uma
construção, através de uma encenação burlesca, de uma pesquisa que já se sabe o
resultado. Querem dizer: não pode ser o Doria porque ele tem uma alta rejeição,
então tem que ser a Simone.
O Doria está conhecendo a face triste da política,
que é a traição pelos seus próprios companheiros.
Por que não acredita na candidatura da Simone
Tebet?
Eu vou defender sempre que o PSDB tenha candidatura
própria. O preço para retirada do Doria pelos seus pretensos aliados não pode
ser nos colocarem em outra incerteza. Nós não sabemos nem sequer se o MDB vai
ter condições de homologar a candidatura da Simone. Simone tem todas as
qualidades para ser candidata, mas rejeito um acordo com MDB agora.
O que deve ser feito com Doria e a candidatura do
PSDB, na sua opinião?
Quem trouxe Mateus ao mundo que o embale. Esse não é
o nome que a cúpula do PSDB quis, que nos privou de ter uma candidatura que
emocionasse, empolgasse o país? Pois bem. Se querem retirar a candidatura do
Doria, que não nos privem da possibilidade de nós mesmos construímos o nosso
destino.
Por que crê que Leite reúne mais condições?
Porque o Doria tem 60% de rejeição. O Eduardo Leite
tem um discurso novo, oxigenaria o partido mesmo que não ganhasse. Eu lamento
que o Doria tenha sido escolhido, trabalhei pelo Leite. Mas o mínimo que se
esperava daqueles que apoiaram o Doria era que estivessem agora tentando
viabilizar a sua candidatura.
O sr. aponta Bruno Araújo e Garcia como os dois principais
responsáveis por essa articulação?
Claro que há outros, mas pelo papel que ocupam [eles
são os principais]. Garcia foi avalista de muitos acordos que viraram votos na
bancada [durante as prévias]. E muitos que viraram deixaram o PSDB. O PSDB perdeu
10, 11 deputados, [sendo que] 80% votaram no Doria nas prévias. Resolveram suas
vidas e foram apoiar outros candidatos.
Como reverter um eventual apoio à candidatura de
Tebet, caso esse seja o resultado?
O presidente Bruno Araújo e a Executiva não têm autoridade
para firmar nenhum compromisso de aliança. Essa responsabilidade é da convenção
partidária. E na convenção vão surgir candidaturas do PSDB. Vão surgir outros
nomes novos.
Quais?
Não vou antecipar. Nem que seja só para demarcar o
campo. Tem deputado dizendo "eu topo ser candidato".
O sr. é contra o acordo com o MDB. Diante disso,
prefere que o PSDB mantenha a candidatura de Doria ou é preciso pensar outro
nome?
Não sou contra a aliança com o MDB, quero que o
partido tenha liberdade, alternativas. Se a candidatura do Doria for retirada
pelos seus aliados, [que a sigla] possa definir se o melhor caminho é não ter
candidatura —o que não defendo—, aliar-se ao MDB ou ter candidatura própria. A
minha posição é pela candidatura própria.
Na convenção, vou defender que o PSDB tenha
candidatura própria. Mas não está mais nas minhas mãos, sou um derrotado nesse
processo. Nós perdemos as prévias e o Leite fez muito bem, quando viu que o
partido não levava em consideração a sua candidatura, de se voltar para o Rio
Grande do Sul. Porque agora só quem pode eventualmente retirar a candidatura
[do Doria] são aqueles que o apoiaram, que votaram nele nas prévias.
Leite ainda é uma alternativa no PSDB?
Eu acho muito difícil. Acho que o tempo passou, ele
está cuidando do Rio Grande do Sul.
Ele vai ser candidato ao governo?
Eu defendo que ele tem que ser candidato a alguma
coisa.
Mas dentro do PSDB quem é alternativa?
Eu não sei.
Tasso Jereissati?
[Na última reunião da Executiva], eu ouvi gente sugerindo que o nome deles [Leite e Tasso]
fossem colocados nessa pesquisa. Eu nem entrei nisso porque acho
que a pesquisa é uma bobagem, uma farsa. É uma forma pouco corajosa para o
presidente do PSDB poder dizer que "Doria não dá mais", atender ao
Garcia e preterir o interesse do PSDB.
O sr. é uma opção da terceira via no PSDB?
Não cogito isso. Eu pretendo ser candidato a
deputado federal.
O sr. diz que a terceira via implodiu e que os
candidatos postos têm baixa intenção de votos. Mas o mesmo poderia ocorrer com
Leite…
Eu não acho. A minha opinião é que nesse momento o
Eduardo Leite teria o apoio desses partidos, porque estamos falando de algo
palpável. Hoje ele estaria com uma candidatura competitiva.
Entre Lula e Bolsonaro, qual deve ser a posição do
PSDB?
Indicar uma candidatura própria mesmo que seja para
perder. Perder unido nesta hora é uma grande coisa.
Mesmo que seja o Doria?
Se for esse o destino, que cada um assuma a sua
responsabilidade.
Se na eleição o PSDB vai diminuir de tamanho, qual
será o papel do partido?
Eu não vou desistir do PSDB. O PSDB terá um papel
decisivo, independentemente do tamanho da bancada. Nosso encontro está marcado
no pós-eleição. O PSDB não é hospedeiro de projetos. Vamos recuperar nosso
papel como um partido que tem projeto de país sendo oposição a Lula ou
Bolsonaro. Mas temos que existir para isso.
Bolsonaro tem criticado reiteradamente o processo
eleitoral. Acha que se trata de uma bravata ou ele pode tomar uma medida
autoritária?
Eu acho certo exagero achar que Bolsonaro possa
atentar contra a democracia. Ele não terá forças e condições para isso.
O sr. questionou o processo eleitoral após perder em
2014. Sua postura não gerou um precedente perigoso?
Esse debate sobre as urnas foi contaminado pelo
radicalismo das posições tanto do presidente como do TSE [Tribunal Superior
Eleitoral] à época do ministro Barroso.
Acho que todos os processos eleitorais no mundo
estão em processo de aprimoramento. Devemos, depois das eleições e fora desse
ambiente, discutir de que forma garantir que a população brasileira no seu
conjunto confie no sistema, seja qual for ele.
Criou-se essa narrativa que eu contestei o resultado
das eleições [de 2014]. Mentira. Às 20h30, quando o TSE anunciou o resultado,
eu liguei para a candidata Dilma Rousseff para parabenizá-la pelas eleições,
desejando que ela pudesse ter forças e condições de unir o Brasil. Essa é a
liturgia que as democracias cumprem.
Vocês decidiram lançar o Marcus
Pestana ao Governo de Minas. Por que a decisão de não apoiar o governador Romeu
Zema?
O Pestana é anos-luz mais qualificado que qualquer um na disputa. O Zema não está à altura do que Minas precisa. [O Pestana] tem toda a condição de crescer pela fragilidade do seu adversário.
O sr. é alvo de processo na Justiça, baseado na delação do Joesley Batista, da JBS, e reconhece que isso atrapalhou o PSDB.
O dano foi enorme, pessoal e para o partido. Isso
foi desmascarado pela Justiça, que mostrou que aquilo foi uma farsa perpetrada
pelo Joesley com a ajuda do procurador Marcello Miller. Nós vamos atuar na
Justiça para responsabilizar os autores dessa farsa.
Mas o MPF (Ministério Público Federal) vai recorrer
da sua absolvição pela Justiça de São Paulo.
O MPF recorre sobre tudo. Você já viu o MPF deixar de recorrer? Eu passei cinco anos com todo tipo de acusação, todos os dias, de todas as mídias. Não se constranja em dizer que eu fui absolvido, porque essa é a realidade.
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