• Para aprovar medida de arrocho fiscal, governo enquadra PT e promete cargos ao PMDB
Júnia Gama, Simone Iglesias, Isabel Braga e Eliane Oliveira – O Globo
Acerto de contas e cargos
BRASÍLIA - Para garantir sua mais importante vitória no Congresso este ano, dando início à aprovação do ajuste fiscal, o governo enquadrou o PT e recorreu à negociação de cargos com os aliados que poderão resultar até mesmo em trocas ministeriais. O Palácio do Planalto obteve êxito com a estratégia e aprovou, na noite de ontem, o texto base da Medida Provisória (MP) 665, que endurece as regras para concessão de seguro-desemprego e abono salarial. O PT se viu pressionado pelo Planalto e pelo PMDB, que ameaçou não aprovar a medida se o principal partido do governo não se comprometesse com o apoio. Para convencer os deputados da base, emissários do Planalto avisaram que uma nova configuração do governo - incluindo o primeiro escalão - dependeria da atuação de cada partido na votação.
Segundo relatos de peemedebistas, o líder do governo, José Guimarães (PT-CE), afirmou à tarde, em reunião com a bancada do partido, que o Planalto estava aguardando a votação da medida para iniciar mudanças na disposição de cargos do governo. A primeira alteração citada como exemplo por Guimarães, de acordo com deputados do PMDB, seria no Ministério do Trabalho, atualmente ocupado pelo PDT com o ministro Manoel Dias, que decidiu fechar posição contrária à MP. No momento em que foi encaminhar o voto contrário do PDT, o líder do partido, André Figueiredo (CE), rechaçou as ameaças:
- O PDT não se rende! O PDT não se vende por cargos. Se for para entregar cargos nos ministérios, entregaremos de bom grado.
Oposição ironiza PT
A garantia de Guimarães foi dada aos deputados do PMDB no momento em que um deles se queixou de que as reivindicações dos partidos aliados não estariam sendo atendidas, apesar do articulador político do governo, o vice-presidente Michel Temer, ter anunciado há cerca de um mês, quando assumiu a função, que o governo começaria a nomear aliados para o segundo escalão. Minutos antes da votação começar no plenário, Guimarães fez um último apelo, ainda mais explícito:
- Vamos votar a MP, porque o governo vai reconhecer os gestos de todos vocês - disse.
Logo que o resultado da votação foi anunciado, com 252 votos favoráveis, 227 contrários e uma abstenção, deputados da oposição ironizaram o PT, com paródia do samba "Vou festejar":
- PT pagou com traição, a quem sempre te deu a mão - bradavam carregando cartazes com a imagem da carteira de trabalho.
Apesar de terem dado um "voto de confiança" ao governo na votação da MP 665, os parlamentares da base avisaram que a MP 664, que dificulta o acesso a pensão e auxílio-doença, não será apoiada sem que as nomeações sejam publicadas. A medida foi aprovada pela comissão especial na terça-feira e está pronta para ser apreciada em plenário. A votação, no entanto, só deve ocorrer semana que vem, pois depende da decisão do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de proceder à sua leitura.
- Não andou nada desde que o Michel assumiu. O Guimarães disse que as mudanças iam depender dessa votação e vamos acreditar. Agora, a 664 o governo não consegue aprovar sem nomear - afirmou um peemedebista da cúpula.
O dia de ontem foi de intensas negociações das bancadas governistas pelos cargos no segundo e terceiro escalões em troca de apoio à MP. Vários recados foram mandados ao governo para que as nomeações fossem agilizadas. Os parlamentares do PP, que até terça-feira se mantinham indecisos sobre as medidas de ajuste, passaram a pregar ontem o voto contra a MP 665, porque não estavam sendo contemplados. Um deputado afirmou ao GLOBO que as nomeações estão atrasadas e que os pedidos do partido, de cargos em bancos públicos, não estão sendo atendidos.
O PR, que também está às voltas com pedidos de emprego, decidiu manter o apoio ao governo, na tentativa de mudar a estratégia habitualmente adotada pelos aliados, do toma-lá-dá-cá, para ver se desta forma terá algum novo cargo. Líderes do governo e aliados admitiram que a falta de pragmatismo do governo em cumprir compromissos com os partidos aliados prejudica as negociações.
- Está demorando mais tempo que o razoável. Se não houver mais pragmatismo e menos ideologia, o governo vai demorar para entrar nos trilhos - disse o vice-líder do governo na Câmara, o deputado Ricardo Barros (PP-PR).
PT deu um voto contra
Logo pela manhã, Michel Temer se reuniu com líderes aliados e ministros, para reforçar a importância da votação do ajuste. Na reunião, o líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), sinalizou que o bloco do PMDB defenderia o adiamento da votação, a menos que a bancada do PT fechasse questão a favor do ajuste.
A pressão do PMDB levou o líder do PT, Sibá Machado (AC) a fazer nova reunião. Depois de três horas de reunião, a bancada do PT continuou sem fechar questão mas garantindo a maioria dos votos. Novamente, foi descartada a punição de petistas que votassem contra as propostas.
- Só não serão 64 deputados do PT porque dois deles estão com problemas de saúde - disse o líder petista.
A realidade se mostrou diferente. Dos 64 deputados do PT, 55 estavam presentes e um deles, Welinton Prado (MG), votou contra a MP.
Logo depois da reunião do PT e do anúncio de apoio à medida do ajuste, Picciani anunciou que a maioria "esmagadora" da bancada do PMDB daria um voto de confiança ao governo e votaria a favor da MP 665. O líder, afirmou, no entanto, que novas conversas serão feitas para definir a votação da MP 664.
Também pela manhã, a presidente Dilma Rousseff apelou à sensibilidade dos parlamentares para aprovar as medidas do ajuste fiscal. Segundo Dilma, apesar das divergências, tanto o Congresso como o governo trabalham a favor do país. Dilma pediu tranquilidade neste momento de divergência entre a base aliada e o Palácio do Planalto.
- É impossível o país achar que ele vive de um dia para o outro grandes transformações. Então, vamos aguardar para ver como transcorre essa votação do ajuste. Vamos nos manter tranquilos. Eu tenho certeza de que haverá, por parte dos parlamentares, a sensibilidade necessária para que se vote o ajuste, principalmente, porque eu tenho consciência e, além disso, tenho a crença de que os parlamentares trabalham a favor do Brasil - disse a presidente. (Colaboraram Catarina Alencastro e Luiza Damé)
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