quinta-feira, 7 de maio de 2015

Míriam Leitão - Razão do ajuste

- O Globo

As medidas do ajuste fiscal não economizam muito, mas vão exatamente em alguns pontos de escalada de aumento de gastos. As despesas com seguro-desemprego e abono salarial dobraram como percentual do PIB. Se não for através do controle desses itens, terá que haver aumento de impostos . Mas a carga tributária subiu até em 2014, ano de PIB estagnado, segundo o IBPT, e bateu novo recorde.

O Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IB PT) acaba de divulgar que a carga tributária subiu de 35,04% para 35,42% do PIB no ano passado, uma alta de 0,38 p.p. em ano de economia parada. Nunca foi tão alta. O brasileiro em 2015 terá que trabalhar de janeiro a maio apenas para pagar tributos aos governos municipal, estadual e federal. Ao longo dos quatro anos do governo Dilma, a elevação total da carga chegou a 1,66 ponto percentual do PIB. Forte incremento, principalmente se for considerado que alguns setores tiveram desonerações. Isso significa que o resto da economia teve que pagar muito mais. Esses dados mostram que o caminho de aumento da carga tributária já se esgotou. Os ex-presidentes Lula e Fernando Henrique também tinham elevado fortemente o peso dos impostos.

A única saída é olhar para os gastos e ver quais precisam de mais controle. O economista Mansueto de Almeida contou que a despesa do governo com seguro-desemprego e abono saiu de 0,49% do PIB, em 2004, para 0,98%, dez anos depois. Subiu em percentuais do PIB, o que é uma insensatez e uma contradição. Afinal, neste período, o desemprego caiu. Evidentemente, era necessário fazer alguma coisa a respeito. Em números absolutos, os gastos saltaram de R$ 9,5 bilhões para R$ 53,8 bilhões. Uma escalada descontrolada. —Há razões para o estouro no custo desses benefícios, como o aumento do salário mínimo, a formalização, a rotatividade, que é uma das maiores do mundo — disse Mansueto ao meu blog.

Mesmo assim, é espantoso, porque, segundo dados do próprio economista, no período em que o desemprego estava mais alto , no governo FHC, o aumento foi modesto. De 1997 a 2004, os dois benefícios ficaram entre 0,46% e 0,49% do PIB. A proposta da equipe econômica apenas dificulta o acesso ao primeiro seguro-desemprego e exige um pouco mais de tempo trabalhado para o direito ao abono. No seguro-desemprego, o tempo exigido saía de seis meses para 18 meses. No Congresso, já foi reduzido para 12 meses. O acesso ao abono saiu de um mês trabalhado para seis meses, mas no Congresso já caiu para três meses. O avanço das últimas horas não garante que as MPs serão aprovadas nas duas Casas, porque, com a briga intestina da base parlamentar, o acordo de hoje vira o conflito de amanhã.

Além disso, há o temor de que, mesmo com as medidas aprovadas, elas acabem carregando propostas que aumentem outros gastos, como o fim do Fator Previdenciário. Na equipe econômica, argumenta- se que a aprovação ajuda a quebrar paradigmas. O primeiro é o de que todos tenham direito, independentemente da idade, a receber pensão vitalícia em caso de morte do cônjuge. Sendo votado em ambas as Casas, seria a primeira vez que se permitiria a diferenciação que existe em vários países do mundo . O problema é que se isso passar ao preço do fim do Fator Previdenciário, o ônus ser á muito maior do que o bônus. O fato é que o governo mandou um ajuste tímido ao Congresso e até agora não há certeza de que ser á aprovado na Câmara e no Senado, porque as propostas foram apanhadas no meio do tiroteio político da base de sustentação do governo Dilma.

A mudança no abono e no seguro-desemprego deveria ter sido feita em época de crescimento da renda e de emprego, mas o governo, em campanha eleitoral, não apenas não fez, como a presidente negou que mudaria os benefícios, proferindo a frase: "nem que a vaca tussa ." Quando falou isso , ela já conhecia esses número se sabia que seria inevitável fazer as mudanças . O ministro Levy disse que, sem as MPs, o corte de gastos no Orçamento será grande. Será grande, de qualquer maneira, a menos que Levy desista de atingir a meta de 1,2% do PIB de superávit primário. Quem vota achando que isso aliviará a conta poderá cobrar do governo depois. O tempo é de incerteza. A crise política está tornando o momento econômico ainda mais difícil

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