Folha de S. Paulo
O que temos é um espectador-geral da
derrocada da República
Eis a provocação trazida pelo meu colega
de Folha Sérgio Rodrigues: "Rola por aí uma teoria da
conspiração curiosa, a de que Augusto Aras não
existe. Isso explicaria muita coisa, mas o fato é que algumas pessoas alegam
ter visto Aras e até conversado com ele. O que é verdade e o que é
mentira?" Bem, eu nunca vi o Aras pessoalmente, devo frisar.
Defendo que Aras não existe. Talvez em
algum lugar em Brasília esteja alguém, um homônimo do dito cujo, a assistir
compulsivamente a sessões do STF sonhando em um dia vestir a toga (aliás, PGR
nem deveria poder ser indicado ao STF). Talvez esse homônimo até escreva
artigos em jornal defendendo que a autocontenção seja o máximo que se pode
esperar dele, quando o que se pede é que apenas faça seu trabalho.
Engana-se quem pensa que estamos diante de
uma omissão;
antiativismo é apenas uma fantasia ufanista usada pelo procurador-geral da
República para mascarar o que de fato faz. Quer prender colunistas de jornal.
Deixa ministros do STF falando sozinhos. Enterra a democracia em uma pilha de
investigações preliminares, as quais, legalmente, nada são: quando se sabem os
fatos e o autor em questão, abre-se inquérito.
Talvez haja alguém que se assente todos os dias na cadeira de procurador-geral (será?). Quiçá até seja um robô posto lá para servir à receita do legalismo autocrático à la Polônia e Hungria: conquistarás as carreiras jurídicas e, então, cooptarás o Estado. Ao menos restam subprocuradores em Brasília, 31 deles para ser preciso, denunciando o óbvio: não temos um procurador-geral da República.
A verdade é que Aras não existe. Não existe
Aras, o procurador-geral, porque o que temos é um espectador-geral da derrocada
da República. Não existe Aras, o omisso, porque não há nada de omisso em
escolher o lado da política, não o da lei. Não existe Aras, o super-poderoso,
porque na República não deveria existir poderes discricionários
personalíssimos. A questão é se há um Conselho Superior do MPF para contrabalanceá-lo
e um Senado para rejeitá-lo.
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