Folha de S. Paulo
Presidente apostou em propagação do vírus e
defende política oficial até hoje
No dia em que a CPI da Covid apresentou um
pedido para punir Jair Bolsonaro por nove crimes, o presidente fez uma espécie
de confissão. Num
palanque do interior do Ceará, ele defendeu a política oficial do governo,
que impulsionou o país além da marca de 600 mil mortos na pandemia.
"Fizemos a coisa certa desde o primeiro momento", declarou.
O relatório final da comissão atribui a Bolsonaro responsabilidade direta por parte do morticínio. O presidente investiu contra o distanciamento, desincentivou o uso de máscaras, patrocinou a distribuição de remédios ineficazes e atrasou a compra de vacinas porque apostava na propagação intencional do vírus.
"Essa estratégia, atrelada à ideia de
que o contágio natural induziria a imunidade coletiva, visava exclusivamente à
retomada das atividades econômicas", conclui
o relatório.
Bolsonaro nunca escondeu que essa foi uma
ação premeditada. No início da crise, o governo quis dar poder ao presidente
para barrar
por decreto o fechamento de atividades nas fases críticas da pandemia.
Ele ainda manteve uma campanha agressiva contra o isolamento e, nesta quarta
(20), repetiu a dose ao chamar a medida de "política nefasta".
A comissão também mostrou que o governo
atrasou deliberadamente a compra de vacinas ao ignorar dezenas de propostas da
Pfizer. A negligência não se deu ao acaso. Bolsonaro fez questão de estimular a
contaminação no lugar dos imunizantes e declarou, mais de uma vez, que o vírus
era a "melhor vacina".
Para convencer a população a se expor ao
contágio, o governo ainda sustentou um kit de medicamentos milagrosos que
transformariam a Covid numa gripezinha. Até hoje, o presidente dá guarida aos
defensores da cloroquina e
de estudos que usaram doentes como cobaias.
A CPI derrapou em diversos momentos, mas
registrou as impressões digitais de Bolsonaro numa gestão que agravou a
pandemia e pode ter deixado de salvar mais de 100 mil vidas. Será impossível
alguém julgar que o presidente fez "a coisa certa".
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