O Estado de S. Paulo
Dutra contará à PF hoje como convenceu Lula
a evitar uma tragédia no dia 8: ‘Vai morrer gente’
O comandante do Exército, Tomás Ribeiro de
Paiva, se esforça para afastar a política da Força e curar as feridas causadas
pela intentona de 8 de janeiro. Ele e seus colegas do Alto-Comando sabem que,
se havia militares de prontidão para retomar as sedes dos Poderes invadidas por
bolsonaristas, isso se devia à decisão do general Gustavo Henrique Dutra de
Menezes de manter a tropa pronta para a ação.
O reforço do Batalhão da Guarda Presidencial (BGP) enviado por Dutra no dia 6 à sede do Executivo havia sido dispensado pelo Gabinete de Segurança Institucional (GSI), um dia antes da confusão. Dutra era o comandante militar do Planalto. Alvo de desconfianças e afastado do cargo, ele vai prestar hoje esclarecimentos à PF no inquérito que apura a participação de militares na baderna.
Após mandar a tropa retomar o Planalto,
Dutra se encontrou com o interventor da Segurança Pública do Distrito Federal,
Ricardo Cappelli, que queria a prisão imediata dos acampados na frente do QG do
Exército. O general alertou que todos estavam cansados, gaseados e nervosos,
que uma operação ali poderia terminar em morte. Dutra telefonou para o general
G. Dias, chefe do GSI, e avisou: “Vai dar merda”. “O presidente está aqui do
meu lado. Fala você para ele”, respondeu G. Dias.
Lula estava irritado. “Presidente, aqui é o
general Dutra.” “General, são todos criminosos e têm de ser presos!” Dutra
retorquiu: “Concordo plenamente com o senhor, mas essa é uma operação complexa,
que precisa de planejamento”. Lula repetiu duas vezes sua frase até que o
general disse: “Concordo com o senhor, mas, até o momento, nós só lamentamos
danos materiais, ao passo que, se entrarmos sem planejamento, vai morrer
gente”. Lula então respondeu: “Isso seria uma tragédia, general. Cerque todo
mundo. Não deixe ninguém sair e prenda todo mundo amanhã. O Múcio (ministro da
Defesa) está aí com o senhor?”. “Não senhor.” “Pois devia estar.” Pouco depois,
o ministro da Defesa chegou ao Comando do Exército. O diálogo de Dutra com o
presidente será relatado pelo general hoje pela primeira vez à PF. Ele disse a
colegas que vai entregar documentos mostrando o que o Exército fez para
desarmar o acampamento bolsonarista, desmentindo versões da Segurança do DF.
Os colegas de Dutra o defendem e dizem que, sem a prudência do general, o desmonte do acampamento terminaria em tragédia. E questionam a razão de a PM não ter prendido os vândalos quando voltavam da Esplanada para o QG. Todos têm certeza de que é preciso apurar os fatos. Mas também é preciso fazer isso com Justiça. A intentona do dia 8 já fez muitas vítimas. Não pode fazer mais uma.
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