sexta-feira, 24 de abril de 2020

Bolsonaro exonera diretor-geral da PF em meio a negociações para permanência de Moro

Exoneração de Valeixo é publicada no Diário Oficial da União; Moro pode deixar governo nesta sexta-feira

Leandro Colon | Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente Jair Bolsonaro exonerou o diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, em publicação no Diário Oficial da União desta sexta-feira (24).

O ministro da Justiça, Sergio Moro, foi alertado por aliados no fim da noite passada de que a saída de Valeixo, escolhido por ele para comandar a PF, poderia ser oficializada no Diário Oficial desta madrugada, enquanto ainda negocia com o Palácio do Planalto sua permanência como ministro.

Conforme a Folha revelou, Moro pediu demissão a Bolsonaro na manhã desta quinta (23) quando foi informado pelo presidente da decisão de trocar Valeixo.

O ministro avisou o presidente que não ficaria no governo com a saída do diretor-geral. Bolsonaro então escalou ministros militares para convencer o ex-juiz da Lava Jato a recuar.

A exoneração foi publicado como "a pedido" de Valdeixo no Diário Oficial, com as assinaturas eletrônicas de Bolsonaro e Moro. Segundo a Folha apurou, porém, o ministro não assinou a medida formalmente nem foi avisado oficialmente pelo Planalto de sua publicação.

O nome de Moro foi incluído no ato de exoneração pelo fato de o diretor da PF ser subordinado a ele. É uma formalidade do Planalto. Além disso, ao contrário do que informa a medida publicada, Valeixo não teria "pedido" sua exoneração ao Planalto. Não há substituto no comando da polícia, por ora, nomeado.

Na avaliação de aliados de Moro, Bolsonaro atropelou de vez o ministro ao ter publicado a demissão de Valeixo durante as discussões que ainda ocorrem nos bastidores sobre a troca na PF e sua permanência no governo. Diante desse cenário, crescem as expectativas sobre a saída do ministro ainda nesta sexta.

Uma solução para sua permanência vem sendo discutida pelos ministros generais da Casa Civil, Walter Braga Netto, e da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos. Segundo assessores presidenciais, uma indicação positiva havia sido dado pelo ministro da Justiça.

Moro havia sinalizado até a noite passada, portanto antes da demissão de Valeixo ser oficializada, que estava disposto a aceitar um acordo desde que tivesse a palavra final na sucessão na Polícia Federal. A dúvida agora é se, com a saída de Valeixo durante as negociações, o ministro topará continuar no governo.

Um nome que conta com a simpatia do ex-juiz da Lava Jato para dirigir a PF, segundo aliados do ministro, é o do diretor do Depen (departamento penitenciário nacional), Fabiano Bordignon.

Já Bolsonaro defende a nomeação para o posto do diretor-geral da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), Alexandre Ramagem, ou do secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, Anderson Torres.

Desde que assumiu o cargo, o presidente Bolsonaro ensaiou em mais de uma oportunidade mudar o comando da Polícia Federal, minando a influência de Moro sobre a cúpula da corporação. Tentativas de ingerência se deram com a abertura e o avanço de investigações contra pessoas do entorno do mandatário.

O incômodo de Bolsonaro com o trabalho da PF aumentou recentemente por causa dos inquéritos que apuram um suposto esquema de fake news para atacar autoridades, entre elas alguns de seus adversários políticos, e as manifestações pró-golpe militar promovidas por grupos bolsonaristas —no domingo (19), o presidente participou de uma delas, em Brasília.

Os dois casos, sob relatoria do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes, devem ser tocados por uma mesma equipe de policiais federais, o que desagrada ao presidente.

A apuração sobre fake news, aberta pelo próprio STF, envolve a suspeita de que filhos de Bolsonaro, entre eles o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), estejam por trás de um gabinete do ódio supostamente mantido pelo Palácio do Planalto para atacar desafetos políticos.

Essa hipótese também foi levantada em Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) sobre o caso no Congresso.

Já a investigação sobre os atos antidemocráticos, proibidos pela Constituição e a Lei de Segurança Nacional, foi aberta a pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras. Ela mira empresários e ao menos dois deputados federais bolsonaristas por, possivelmente, terem organizado e financiado os eventos. Os nomes são mantidos em sigilo pela PGR (Procuradoria-Geral da República).

Um dos primeiros incômodos do presidente com a PF na gestão Moro se deu no início do mandato, com a instauração de inquérito contra o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, para apurar esquema de candidaturas laranjas do PSL em Minas Gerais, caso revelado pela Folha.

Em outubro, o ministro foi denunciado à Justiça sob acusação de falsidade ideológica eleitoral, apropriação indébita de recurso eleitoral e associação criminosa.

Apesar do constrangimento gerado pela situação, o presidente manteve o aliado no cargo. Em mais de uma oportunidade, demonstrou irritação com as conclusões sobre o caso. Ainda em outubro, ele disse que o responsável pela investigação na PF “agiu de má-fé”, que houve “exagero” no inquérito e que a intenção não foi atingir o ministro, mas o presidente da República.

A reação se deu após a Folha noticiar que um depoimento e uma planilha obtidos pela Superintendência da PF em Minas sugerem que recursos do laranjal foram desviados para abastecer, por meio de caixa dois, a campanha presidencial de Bolsonaro.

Dois meses antes, o presidente havia gerado instabilidade na PF ao anunciar que trocaria o superintendente do órgão no Rio de Janeiro, Ricardo Saadi, por questões de gestão e produtividade.

Foi rebatido por uma nota da própria corporação, que informou que a mudança de comando já vinha sendo debatida internamente e havia sido solicitada pelo próprio policial, não tendo relação com seu desempenho.

Bolsonaro subiu o tom e declarou que quem dava as ordens na polícia era ele próprio. "Se ele resolveu mudar, vai ter que falar comigo. Quem manda sou eu, vou deixar bem claro. Eu dou liberdade para os ministros todos, mas quem manda sou eu”, declarou.

Na ocasião, Moro estava enfraquecido pela divulgação de mensagens que mostraram sua atuação em parceria com os procuradores em diferentes processos da Lava Jato e que colocaram em xeque sua atuação como juiz federal.

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