O Globo
A voz do ex-juiz e ex-ministro Sérgio Moro
é de taquara rachada. Já foi bem pior. Isso o deixa nervoso e suando na hora de
discursar, porque uma palavra em falsete sai do tom no meio da frase. Taquara é
uma planta da família dos bambus. A maioria tem caules ocos. Quando a taquara
está verde e se quebra, o som é desagradável, estridente.
Não sei se Moro tem cabeça oca e se está
verde ou maduro para uma campanha presidencial, mas todos sabemos que o governo
Bolsonaro está pra lá de podre. Moro é quem mais racha a direita. Não é o
preferido da extrema-direita histérica e desarvorada (desculpe o pleonasmo). É
o candidato dos bolsonaristas arrependidos, que preferem voz fina a baixo
calão.
“Moro tira parcela importante dos votos de Bolsonaro e ameaça o segundo turno de Bolsonaro”, me disse o sociólogo Sérgio Abranches. “A última pesquisa Quaest pergunta se Bolsonaro merece mais quatro anos de mandato. E 40% dos que votaram nele em 2018 dizem que não merece. O eleitorado volante e conservador, preocupado com a desordem brasileira e frustrado com a corrupção, e que acreditou naquele sujeito vindo do nada, um deputado medíocre que empolgava como durão, esse eleitor abandonou o Bolsonaro. E é o eleitor do Moro”.
O ex-juiz precisa intensificar as aulas de
fonoaudiologia se quiser ser o Ciro da direita e fulminar o arquirrival
Bolsonaro, que ele mesmo ajudou a eleger em 2018, rasgando a toga. Moro não tem
mais como recorrer às setinhas do Power-Deltan-Point ou a telefonemas vazados,
agora é só sua voz mesmo e as pausas para o sorrisinho e a claque. Ele
reconhece que esganiça na hora h. Ainda sai “coupção” em vez de
“corrupção”.
Abranches acha que Moro surpreendeu por
estar bem treinado. No período fora dos holofotes, aprendeu a ler no
teleprompter, a falar de um jeito mais palatável para o eleitor comum, sem
juridiquês. Não tem carisma, não empolga. “Mas, se eu fosse marqueteiro hoje,
diria que o Brasil está querendo menos um cara espetacular e mais um técnico
frio. Só que tem o Lula, numa trajetória aparentemente incontestável. E o Moro
não tira voto do Lula. Não pode. Seria o algoz contra a vítima”.
Claro que o ex-juiz da Lava-Jato deve ter
contratado um “coach vocal”. Na filiação ao Podemos, Moro controlou melhor as
derrapagens sonoras. Pediu que não prestemos atenção em sua voz, mas em suas
palavras. Prometeu ouvir o Brasil. Se possível, senhor juiz, sem nos grampear
ilegalmente, sem vazar nossas ligações. Porque a rejeição a seu nome só é menor
que a de Bolsonaro, que reagiu ao discurso: “Tinham (sic) dois
teleprompter lá. O cara leu. Não aprendeu nada, não sabe o que é ser presidente
nem ministro”. Até que enfim temos uma direita dividida.
Há youtubers cantores que ensinam a ter voz
mais afinada. Um deles, Beto Sorolli, aconselha prestar atenção em três passos.
A inspiração e expiração, com costelas abertas e umbigo pra dentro. O
fechamento das pregas (vocais), esticando ou contraindo, mas com consciência,
escolhendo a hora. E finalmente os espaços onde a voz se projeta (ressonância)
para expandir a consciência. Não dá para ficar oscilando sem critério ou
controle, diz Sorolli.
Não é que a fonoaudiologia tem tudo a ver
com a política? Então, Moro, para atiçar ainda mais a ira da família rachadinha
e tirar Bolsonaro do segundo turno em 2022, não esqueça: umbigo pra dentro,
pregas no lugar e expansão da consciência. Para falar grosso contra os
fascistas. Morô?
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