Ao
levar o rebanho para o abismo da morte, mentindo, Bolsonaro é o Anticristo da
pandemia
“Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida”, disse Jesus (João, 14; 6). João Evangelista, xará de meu avô paterno, era um marqueteiro de gênio: o slogan, composto em tríduo, como convém a apelos que vão ao coração e de lá à razão, resume bem a mensagem, que, creia-se ou não nela, é a mais completa tradução da busca da civilização na demolição da barbárie: a imunidade do espírito pela união do rebanho, com a busca permanente do conhecimento para retardar o fim pela sabedoria. Em três anos de seminário menor, preparei-me em orações, meditações e leituras para encarar o destino, não com trapaças e rixas, mas com resignação e fé. Ou seja, uma mistura de coragem e prudência, preservando o medo, forma imperfeita do cuidado.
Jair
Bolsonaro diz-se cristão, exalta Deus como guia, mas, como nunca se deu ao
trabalho de ler coisa nenhuma, não se dá conta de que a trilha que segue é o
descaminho. Capitão na ativa do Exército, planejou, juntamente com o parceiro
de patente Fábio Silva, atentados a bomba em quartéis e na adutora do rio
Guandu. Foi condenado por 3 a 0 por terrorismo e indisciplina, na primeira
instância. O terror, arma do fundamentalismo religioso radical, seja dos
inquisidores católicos medievais, seja de atuais fanáticos de Alá, é um coito
de assassinos vocacionais. Ele próprio se define como artilheiro, cuja
modalidade é matar. Mente ao rememorar sua participação no combate ao terror de
esquerda durante a ditadura. Quando a guerrilha comunista passou pelo Vale do
Ribeira, onde morava, não tinha idade para o serviço militar. Uma patranha
fácil de desmascarar. Não serviu no Suez nem no Haiti. Nunca participou de uma
batalha ou de uma escaramuça. Nada fez de útil em proveito de alguém que não
seja ele ou parente seu.
Matar,
para ele, não é ofício de soldado, mas vício de charlatão. Em 27 anos na Câmara
dos Deputados, em parceria com o médico petista e sindicalista Arlindo
Chinaglia, lutou, e ainda luta, pela aprovação da picaretagem médica da pílula
do câncer. Vendendo cloroquina a emas no jardim do Palácio da Alvorada, faz o
que sempre quis na vida toda: ser camelô de feira livre vendendo óleo de cobra
para quaisquer achaques. Ao deblaterar contra o isolamento para evitar o
contágio pelo contato com saliva infectada pelo novo coronavírus, não o faz por
vocação para a delinquência no exercício ilegal de medicina, mas pela atração
irresistível à propagação da morte. Artilheiro que nunca atirou em alvo móvel,
quer se consagrar como capitão sem noção das tropas invisíveis do coronel
vírus, venha ele da China ou da Martinica.
Apraz-lhe
que este se propague pelo mundo e se aproveite para fazer do Brasil cova rasa.
Quando definiu a praga como “gripezinha”, não quis desafiá-la, foi pelo mero
prazer do engano pelo engodo. À falta de um QI que o aproxime de seres humanos
normais, orgulha-se da própria limitação, por usá-la e assim se dar bem na
vida. A oportunidade de voltar a mentir um ano depois, valendo-se dos rebentos
irracionais que gerou, é a oportunosa ensancha de parecer superior aos outros
pelo menos no cinismo sem limite. Num tribunal eclesiástico medieval seria
condenado à fogueira por blasfêmia após pecar demais sem motivo justo algum. É
o pleno Anticristo: o desvio, a mentira e a morte.
Seu alter
ego pelo avesso, Lula, proclamou que a Terra é redonda para humilhar o
inimigo, visto como terraplanista. Bobão! Bolsonaro não passa de um oportunista
rastaquera que se aproveitou da onda contra a roubalheira e o petismo genérico,
que a pratica, para ganhar a eleição presidencial de 2018. E exercer o trabalho
que esquerda desunida e Centrão glutão não teriam coragem de realizar sem seu
concurso: jogar a Lava Jato e qualquer tipo de higienização na fossa, à qual
também destinou o combate à corrupção em geral.
O
empresário carioca Paulo Marinho, suplente de seu primogênito sonso, lembrou no
Twitter: “Essa data me fez lembrar um dia durante a campanha em que estávamos
na minha casa e você disse: ‘Se nós não fizermos tudo certo, podemos sair
presos’. Hoje eu entendo a sua preocupação e não tenho mais dúvidas de que você
será preso, é uma questão de tempo. Sua omissão, negligência e incompetência
criminosas já custaram quase 300 mil vidas brasileiras. O seu governo é o beijo
da morte!”. O homem que cedeu a própria casa para quartel-general de sua
campanha vitoriosa não percebeu que sua disposição de enganar elimina qualquer
laivo de memória. O “cavalão de Troia”, que executa no terceiro ano de gestão o
que o Centrão e a esquerda não conseguiram em 16, não perde tempo com nada que
não seja o interesse pessoal e dos herdeiros, para os quais lega o sangue, o
suor e o pranto dos brasileiros que o elegeram ou que não têm coragem de
expulsá-lo do descaminho.
Os fanáticos que se manifestam a favor do contágio mortal da pandemia em prol de lojas, estádios e cassinos abertos são oportunistas que o veneram porque venderam a alma ao diabo, cujo pacto seduz mais do que a árdua e nada prazerosa caridade cristã. O resto são cinzas frias.
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