O Brasil precisa parar por duas semanas. Nosso sistema hospitalar não dá mais conta de resistir a medidas paliativas ou meramente figurativas de distanciamento social nem à recusa suicida de grande parcela da sociedade em fazer o mínimo: a parte de cada um para evitar o morticínio.
A
troca de guarda no Ministério da Saúde, já é possível ver, será de seis por
meia dúzia. Marcelo Queiroga até conforta pela fala mansa, conciliatória,
contrastante com o tom arrogante e desconectado da realidade do general Eduardo
Pazuello.
Suas
credenciais, que colhi em entrevistas com médicos e dirigentes de entidades
médicas, são boas, de alguém zeloso da ciência e das evidências, que não
aderirá facilmente a condutas criminosas como as que Pazuello chancelou batendo
continência.
Só
que isso não basta. Para que se mude o rumo da tragédia sanitária brasileira,
que preocupa o mundo e condena o planeta a não superar a pandemia, é preciso
que o Brasil pare, se tranque em casa e dê apoio muito mais intensivo e urgente
aos que não têm de onde tirar o sustento a não ser na rua e a empresas que
quebrarão se fecharem as portas.
Mas elas precisam fechar, sob pena de continuarmos a assistir diariamente à perda de mais de 2.000 pessoas como se isso fosse um dado da natureza.
Não
há paralelo em nenhum outro país de tolerância por tanto tempo, e em números
tão elevados, com a carnificina. Como se estivéssemos propositalmente jogando
gente como nós, brasileiros com todos os direitos e deveres, ao mar para assegurar
os poucos coletes salva-vidas restantes. Isso não é aceitável nos planos
político, jurídico, ético ou moral. Tal comportamento faz de todos, governantes
ou não, cúmplices de chacinas diárias e espalhadas por todo o território
nacional.
Faz
de nós um país de pessoas que aceitam um pacto macabro com Bolsonaro a favor da
morte. Se toparmos ser parte dessa estratégia, a História cobrará não só dele,
mas de cada um que viveu na década de 2020.
Parar
custará muito em termos de transferência de renda às pessoas, de recursos aos
entes subnacionais e de apoio na forma de crédito, isenção tributária ou
subsídio a empresas, inclusive com redução de salários.
Mas
não há nenhuma outra medida que, na falta criminosa de vacina em quantidade ao
menos razoável, nos tire desta guerra em que estamos enfrentando o vírus
desarmados.
Em
vez de querer tirar uma casquinha obscena da popularidade dos governadores
todos os dias, o presidente que somos condenados a ter no tempo mais grave das
nossas vidas precisa ajudá-los, dar-lhes um suporte. Precisa ser obrigado a
fazer isso pelo Judiciário, que até já ensaiou fazer isso, mas que precisa
fazer cumprir suas decisões, senão viram letra morta.
Bolsonaro
precisa ser forçado a endossar o lockdown por um Congresso que até aqui tem sido
seu comparsa. Fechado com ele por interesses indizíveis, que nada têm a ver com
o dos brasileiros que querem um leito e oxigênio para seus pais, avós e filhos.
O
cronograma mentiroso de vacinas de Pazuello, que Queiroga endossou alegremente,
fala em mais de 500 milhões de doses de imunizantes de procedência diversa até
o fim do ano. Não para em pé nem sequer no que promete para março, incluindo no
cômputo 8 milhões de unidades procedentes de um laboratório da Índia que nem
concluiu a fase 3 de estudos. Trata-se de uma empulhação criminosa.
Ou o lockdown é assumido como política de Estado pelo Brasil, como foi com desassombro por países tão diversos quanto Nova Zelândia, Portugal, Chile e Alemanha, ou amanhã teremos de lidar com números mais sombrios. E por muito tempo, já que Bolsonaro zombou da pandemia, pisoteou cadáveres, desdenhou vacinas e nos trouxe até aqui.
Nenhum comentário:
Postar um comentário