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O Globo
Nada
como uma competição, dogma do sistema capitalista que nenhum dos dois,
Bolsonaro ou Lula, aceita integralmente. Não gostam de privatizações, querem o
Estado induzindo a economia brasileira, usando as estatais como fonte de
recursos políticos e econômicos. Bolsonaro, logo depois da fala de Lula,
apareceu de máscara em solenidade pública, e nas redes sociais seu filho, o
senador Flávio Bolsonaro, postou a foto do pai com o slogan: “A vacina é nossa
arma”. Parecia um slogan do governador paulista, João Doria.
Seria incorreto dizer que, afinal, Bolsonaro tem um adversário à altura na
corrida presidencial. Mas é fato que a disputa entre um presidente no mandato
contra um ex-presidente de dois mandatos é diferente. Como a pandemia se
tornará o grande tema político nos próximos meses, a partir do patamar trágico
de mais de 2 mil mortes diárias, o discurso do ex-presidente Lula foi um
lançamento em alto estilo de sua candidatura, falando coisas sensatas e dando
indicações do que faria se estivesse no governo.
Um comitê de crise, uma informação constante, com orientação à população e,
sobretudo, incentivar a vacinação e não desdenhar a ciência são medidas de bom
senso. Mas Luiz Mandetta, quando era ministro da Saúde, fez isso, e o
governador João Doria está fazendo desde os primeiros dias da pandemia. Com
vantagem para Doria, que tem o Instituto Butantan e a vacina CoronaVac para
imunizar os habitantes de São Paulo e ainda distribuir doses por outros
estados.
Além do mais, a economia do estado que ele governa foi a única que cresceu
positivamente durante a pandemia e deve permanecer assim enquanto o resto do
país sofre os desmandos do governo federal. O PSDB decidiu fazer eleições
primárias entre Doria e o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, para
escolher seu candidato. Fazendo isso, ganhará uma consistência partidária que
dará ao escolhido condições de disputar a eleição presidencial com uma base
mais sólida do que em 2018.
O ex-presidente Lula apareceu ontem reciclando o personagem Lulinha, Paz e
Amor, criado pelo marqueteiro Duda Mendonça em 2002, fazendo oposição a
Bolsonaro, com afirmações de que o governo não cuida dos jovens, nem da
economia, nem do emprego. Não totalmente paz e amor, no entanto. Talvez tenha
querido deixar o passado para trás gastando um pouco da sua bile com os
inimigos costumeiros, especialmente o ex-juiz Sergio Moro, que quer ver
destruído.
Normal para quem ficou preso mais de 500 dias e agora vê os processos anulados.
Lula foi vítima e beneficiário de uma disputa de narrativas em torno da
Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). Com o fim da prisão em segunda
instância, que o levou à cadeia, foi solto e, agora, com a mudança do foro
competente para julgá-lo, teve os processos anulados.
Sem surpresas, mostrou-se próximo ao atual presidente quando criticou as
privatizações, também quando atacou o jornalismo profissional. Bolsonaro quer
fechar jornais, Lula quer controlá-los. O passado do PT condena Lula, mas o
presente lhe é favorável, pois, se não foi inocentado, seus processos foram
encaminhados para a Justiça Federal do Distrito Federal.
Começar todos da estaca zero, em outra jurisdição, é o que de melhor pode
acontecer a Lula, pois a prescrição fatalmente acontecerá. Mas não está inocentado,
e os roubos ocorridos na Petrobras e em outras estatais estão indelevelmente
marcados na História do país. Temos, então, o maior erro judiciário da
história, na versão de Lula, ou o maior caso de corrupção já registrado no
país, talvez no mundo. Os que delataram, os que devolveram milhões de dólares e
de reais aos cofres públicos, não deixam que se esqueça o esquema que foi
montado.
Assim como não se pode esquecer que o presidente Bolsonaro ganhou uma eleição
sobretudo porque absorveu o espírito do tempo e apoiou enfaticamente a economia
liberal e o combate à corrupção, temas alheios a ele. Só lhe resta o
antipetismo, forte fonte de apoios. Mas terá que disputar com os governadores
Doria ou Eduardo Leite, o ex-ministro Ciro Gomes, e outros, esse espaço. Não
podemos continuar a escolher o menos pior. Dois erros antigos não se
transformam em um acerto.
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